quarta-feira, 24 de março de 2010

P001 - Jurisdição - Ação - Processo

P001

Notas Didáticas de Direito Processual
Jurisdição, Ação, Processo e Procedimento
Jorge Ferreira da Silva Filho
Professor de Direito Processual Civil do Centro Universitário do Leste Mineiro – UNILESTE
Mestre em Direito Público pela Universidade Gama Filho
Especialista em Direito Processual pela Escola Superior de Advocacia da OAB-MG



1. Propedêutica. O aluno do curso de direito enfrenta dificuldades quanto à fixação dos seguintes conceitos jurídicos: jurisdição; ação; processo e procedimento. Isso decorre principalmente de dois fatores: uso incorreto das palavras no contexto semântico jurídico, deflagrados pelo próprio legislador; o emprego costumeiro das palavras retro, fora do contexto próprio, pela maioria das pessoas que lidam no mundo jurídico: advogados, juízes, membros do Ministério Público. Torna-se, pois, importante examinar com cuidado o significado jurídico correto dessas expressões, pois assim se poderá melhor aproveitar a leitura dos nossos códigos.

2. Jurisdição. O legislador não se preocupou em definir ou conceituar a jurisdição. A doutrina é que se ocupou disso e, com razoável uniformidade, ela se posiciona dizendo que a jurisdição é o ato de o Estado[I], pela pessoa de um juiz, ou de um órgão colegiado, dizer com quem está o direito ou, ainda, dizer que um ato está conforme o direito. Isso significa que o Estado dirá quem tem razão numa lide[II] (o autor ou o réu) ou, ainda, chancelará (homologará; permitirá) a realização de um ato desejado por uma ou mais pessoas ( v.g. uma separação judicial amigável). Importante lembrar que o Estado, como regra geral, não permite que as pessoas busquem os seus direitos diretamente – com as próprias mãos[III]. Em outras palavras, quem pode praticar a jurisdição é o Estado, por meio do juiz natural. Quando a jurisdição versa sobre uma lide, diz-se que a jurisdição é contenciosa. Quando a jurisdição apenas integra a vontade das partes, em consonância com o ordenamento jurídico, ela se denomina jurisdição voluntária[IV].

3. Ação. Atualmente, a palavra “ação” tem a seguinte condensação de sentido: poder constitucional dado às pessoas (naturais, jurídicas, entes coletivos, o próprio Estado) de provocar o Poder Judiciário, devendo usar para isso, a forma adequada prescrita em lei, para que este decida sobre um pedido (condenatório, declaratório, constitutivo, acautelatório, etc).[V] Quem provoca o Estado se denomina autor. É irrelevante para a o exercício desse direito – direito de ação – perguntar se o autor teria ou não teria razão quanto ao seu pedido. O direito de provocar o judiciário é um direito fundamental (Art. 5º, XXXV, CF). Infelizmente, nosso legislador optou por usar a palavra “ação” para designar remédios processuais, ou seja, espécies de procedimentos. Como exemplos, têm-se: “ação de depósito”; “ação de consignação em pagamento”, sendo que a terminologia coerente seria: Procedimento especial para consignar pagamento; procedimento especial para reaver coisa depositada etc. A confusão se torna ainda maior quando se depara com as denominações: ação ordinária; ação sumária etc. A coerência sistêmica levaria tais expressões a serem substituídas por: processo cognitivo com procedimento ordinário; processo cognitivo com procedimento sumário. No estágio atual seria muito difícil reverter essas impropriedades, devido à generalização do emprego dessas expressões. [VI]

4. O Processo. A maioria dos alunos tem dificuldade para diferençar processo de procedimento. Isso decorre de muitos fatores, dentre os quais se aponta o fato de que é quase impossível falar em processo sem fazer referência ao procedimento[VII]. O processo, judicial ou administrativo, é uma criação humana especial quanto à sua finalidade, modo de existir e de se exteriorizar. Trata-se de um meio criado, como via obrigatória de ser utilizada pelas pessoas, para provocar o Estado a cumprir sua função jurisdicional. Este meio [o processo] estabelece regras de comunicação entre as partes[VIII] e o juiz (Como, Quando, o quê a quem, Onde se dirigir etc.). Em outros termos, visto por este ângulo, o processo é uma relação jurídica com regras obrigatórias que se estabelece entre o autor, o juiz e o réu (se houver). As regras obrigam as partes e principalmente o juiz, pois, com isso, evita a arbitrariedade do julgador e confere segurança jurídica quanto ao tratamento igual do Estado às partes. Uma outra forma de perceber o processo se dá pelo enfoque sobre as atividades desenvolvidas pelo juiz e pela parte; são os atos (Elaboração da petição inicial com observância do conteúdo determinado em lei; distribuição da petição inicial; indeferimento da petição inicial; recebimento da petição inicial; mandado de citação com prazo para contestar; apresentação da contestação; certificação do prazo em que foi apresentada a contestação; intimação do autor para impugnar; designação de audiência preliminar; decisão sobre as preliminares arguídas pelo réu na audiência preliminar etc). São os atos; atos jurídicos que se sucedem, em dada ordem. Daí porque vários doutrinadores definem o processo como sequência de atos pré-ordenada[IX]. O legislador resolveu, por uma questão metodológica, classificar o processo segundo o tipo de pronunciamento judicial buscado pela parte autora, daí resultando: O processo de conhecimento; o processo de execução; o processo cautelar.

5. O Procedimento. Há, na legislação processual, diversas formas de organização dos atos que caracterizam determinado processo (formas e sequências de produção). Como exemplo, temos o caso do art. 285 do CPC que ordena ao juiz expedir mandado de citação ao réu, esperar a contestação e depois designar a audiência para tentativa de conciliação. De outro lado, nos termos do art. 278 do CPC, o juiz simplesmente ordenará a citação do réu, designará a data da audiência de conciliação e nesta ocasião é que o réu apresentará sua contestação. A essas diferentes vias de o legislador organizar a realização dos atos no processo, dá-se o nome de procedimento[X]. Na essência, ou seja, ontologicamente, não se diferencia processo de procedimento, pois ambos são constituídos de atos. O procedimento reside na forma com que os atos se desenvolvem. Por isso que é usual aplicar a palavra rito, como sinônimo de procedimento. O processo se relaciona com a substância dos atos. O procedimento se capta na forma de desenvolvimento dos atos, no tempo e no espaço. O processo é o ator, o procedimento a vestimenta do ator, adequada ao seu papel.

6. Procedimento comum e procedimento especial. O Código de Processo Civil brasileiro, divergindo da estrutura temática de outros códigos processuais europeus[XI], não contém uma parte geral. Isso, porém, não quer dizer que a parte geral do CPC não exista, pois ela está disseminada em vários artigos do Livro I – Processo de Conhecimento, tais como o art. 282, pois ele baliza as petições iniciais de todos os outros processos. É no Livro I do CPC, que se encontra o art. 272 do CPC, dispositivo nuclear para entender o significado das expressões “procedimento comum” e “procedimento especial”. No sentido coloquial, a palavra comum é empregada como adjetivo para qualificar aquilo que se apresenta como rotineiro, vulgar, trivial, ordinário, que serve para tudo. De outro lado, especial é aquilo que se apresenta com alguma diferença em relação ao que normalmente se verifica. Esse é o sentido do procedimento especial, ou seja, aquele que se afasta do procedimento comum. Por isso, de fundamental importância é o domínio do conceito de procedimento comum, caso contrário, não se perceberá a sutileza caracterizadora da especialidade de um procedimento. Diz o art. 272 do CPC, que o procedimento comum comporta duas vias de apresentação: o procedimento (rito) ordinário; o procedimento (rito) sumário. No parágrafo único do artigo 272, o legislador informa que o procedimento especial se rege por disposições próprias e, apenas subsidiariamente, se lhe aplica as disposições do procedimento ordinário. O procedimento comum ordinário se rege pelas regras contidas nos artigos 282 a 475-R do CPC. O procedimento comum sumário está regulado nos artigos 275 a 281 do CPC.[XII] Os procedimentos especiais estão localizados no Livro IV do CPC e também em leis esparsas, tais como a lei do mandado de segurança; a lei a ação civil pública etc.

6. As características do procedimento comum ordinário. Deflagra-se o procedimento comum ordinário com a distribuição da petição (distribuição da ação na linguagem comum), devendo essa ser redigida com observância do art. 282 do CPC. Depois de distribuída a petição essa seguirá para o exame inicial do juiz (conclusão), abrindo-se as seguintes alternativas: o juiz recebe a petição inicial e ordena a citação do réu; o juiz detectando defeito sanável, abre prazo ao autor para emendar a inicial; o juiz indefere a petição inicial e extingue “o processo sem resolução do mérito”; o juiz se declara incompetente, impedido ou suspeito e declina de seu poder de jurisdição. Se a petição inicial for recebida, expede-se o mandado de citação e, depois de realizada esta, o réu disporá de 15 dias para contestar. Na contestação o réu tem apenas as seguintes alternativas: nega, fundamentando, as alegações contidas na inicial; não nega as alegações fáticas do autor, todavia afirma no sentido de haver fatos outros que modificam, extinguem ou impedem que se atenda o pleito do autor; fica inerte, podendo verificar ou não o efeito da revelia. O réu não faz pedido na contestação, porém poderá, juntamente com essa, oferecer outras peças processuais (Reconvenção; incidentes de impugnação ao valor da causa ou ao requerimento de justiça gratuita etc.). Se o réu levantar na contestação [argüir] a existência de questões que devem ser decididas antes da instrução processual ou da sentença (argüição de preliminares), o juiz abrirá vista ao autor da “ação” para que este manifeste no prazo de 10 dias. Abre-se também vista se com a contestação vier algum documento anexado, porém o prazo será o normal – cinco dias. Vencida essa etapa, o juiz designa, se for o caso, a audiência preliminar. Nesta, o magistrado deve decidir sobre as preliminares levantadas pelo réu e também sobre as provas que interessam ao feito. Se for deferida a prova pericial, nomeia-se um perito e as partes apresentam os quesitos e indicam seus assistentes técnicos. Apresentado o laudo pericial, designa, se for o caso, a audiência de instrução e julgamento, na qual são colhidos os depoimentos das testemunhas e, às vezes, a oitiva do perito. Vencidas essas etapas o processo (os autos do processo) fica com juiz para dar a sentença. Na sentença o juiz julgará procedente ou improcedente o pedido do autor. Nada se fala em relação a requerimentos do réu. Entretanto, se o réu tiver oferecido a reconvenção, o juiz decidirá se os pedidos do réu na reconvenção (pedidos do reconvinte) são ou não procedentes.

7. Técnicas de especialização dos procedimentos. O legislador criou vários procedimentos especiais, que se caracterizam por dois aspectos: 1º) pelo enunciado expresso do direito que se quer tutelar com o procedimento especial; 2º) pelo afastamento de uma ou mais das características procedimentais do rito ordinário. [XIII] O elemento diferenciador pode estar localizado, por exemplo: no prazo para contestar[XIV]; na possibilidade de formulação de pedido contraposto, tornando desnecessária a reconvenção; no efeito executivo da sentença; no efeito mandamental da sentença; na prolação de sentenças em duas etapas; na permissão para o juízo de equidade; na concessão de antecipação de tutela sem os requisitos específicos do art. 273 do CPC[XV]; na quebra do princípio da inalterabilidade do pedido[XVI].

[I] Explica Pontes de Miranda: “Jurisdição é a atividade do Estado para aplicar as leis como função específica” – Cf. MIRANDA, Pontes de. Tratado das ações. Tomo I .Campinas Bookseller, 1998, p. 250.
[II] Lide, na proposição de Carnelutti, é “o conflito de interesses qualificado pela pretensão de um e pela resistência do outro interessado” – Cf. MARINONI, Luiz Guilherme. Teoria Geral do Processo. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 37.
[III] “Antes de ter o Estado monopolizado a função de julgar, havia a justiça de mão própria, mas essa justiça ainda não era aplicação da lei como função específica”. Cf. MIRANDA, Pontes de. Tratado das ações. Tomo .Campinas Bookseller, 1998, p. 250.
[IV] “Em outros termos, só se estará diante de verdadeira jurisdição voluntária quando o demandante estiver em juízo pretendendo obter um ato judicial que confira validade e eficácia a um negócio jurídico de direito privado que, sem a participação do juiz, seria inválido e ineficaz”. Cf. CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. vol. III. 12. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, p.566
[V] “ação é o direito subjetivo público, autônomo e abstrato de pleitear ap Poder Judiciário decisão sobre uma pretensão, conexo a ela, para a atuação da jurisdição e por intermédio do processo” – Cf. GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro. Vol. 1. 20. ed. – atualizada até a Lei 11.441 / 2007. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 79. “A ação é um direito que tem o particular de requerer tutela jurisdicional” – SANTOS, Ernane Fidélis dos. Manual de direito processual civil. Vol. 1. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 604.
[VI] Melhor andaram os italianos, pois não a palavra ação para designar qualquer categoria de procedimento, principalmente os procedimentos especiais. De forma coerente, os italianos, sob a rubrica Dell’esercizio dell’ azione, descrevem o procedimento comum (art. 99 – Codice de Procedura Civile. Chi vuole far valere um diritto in giudizio deve propore domanda al giudice competente).
[VII] Nesse sentido: “Processo civil é o procedimento regulado por lei ou outra fonte de direito para realização do direito...” MIRANDA, Pontes de. Tratado das ações. Tomo I.Campinas Bookseller, 1998, p. 298. E ainda: “Não há processo sem procedimento e não procedimento que não se refira a um processo” – GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro. Vol. 2. 18. ed. – atualizada até a Lei 11.441 / 2007. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 87.
[VIII] “Partes ou parte”, aqui, podem significar: autor e réu numa lide; ou ainda aqueles que simplesmente buscam a chancela judicial para validar seus atos – divórcio consensual; interpelação; etc.
[IX] “Processo é a soma de atos que objetivam determinado fim” – Cf. SANTOS, Ernane Fidélis dos. Manual de direito processual civil. Vol. 1. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 29. E ainda, processo “é o complexo de atos coordenados logicamente para alcançar um fim, qual seja, a tutela jurisdicional” – Cf. LOPES, João Batista. Curso de direito processual civil: parte geral. São Paulo: Atlas, 2005, p. 133.
[X] FAZZALARI se posiciona dizendo que “O procedimento se apresenta, pois, como uma sequência de atos os quais são previstos e valorados pela norma” – Cf. Elio Fazzalari. Instituições de direito processual. Campinas: Bookseller, 2006, p.114. “Na exteriorização, o processo se revela como sucessão ordenada de atos dentro de modelos previstos pela lei, que é o procedimento” – Cf. GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro. Vol. 2. 18. ed. – atualizada até a Lei 11.441 / 2007. São Paulo: Saraiva, 2007, p.87.
[XI] O Código de Processo Civil Italiano está organizado em quatro livros, sob as seguintes rubricas: Disposições Gerais (Disposizioni generali); Do processo de conhecimento (Del processo di congnizione); Do processo de execução (Del processo di esecuzione); Dos procedimentos especiais (Dei procedimenti speciali).
[XII] Não me parece lógico classificar o procedimento sumário como espécie de procedimento comum, haja vista que o próprio parágrafo único do art. 272 do CPC, claramente diferencia o rito sumário do rito ordinário pelo aspecto daquele ter disposições próprias. Se há disposições diferentes para este procedimento, ele não pode ser qualificado com comum. Melhor a estrutura do Código de processo italiano que trata dos procedimento sumário, no título I do Livro IV como categoria de Procedimento Especial (Dei procedimenti sommari: artigos 633 a 705).
[XIII] “Tantas são as peculiaridades e desvios procedimentais em confronto com o procedimento ordinário, que por vezes é difícil, quando não impossível, o enquadramento dos procedimentos especiais na teoria geral do processo, resultando, daí, a necessidade de criar-se uma teoria específica para eles” – Cf. MARCATO, Antônio Carlos. Procedimentos especiais. 11. ed. – São Paulo: Atlas, 2005, p. 61.
[XIV] Artigos 905, 915, 930, 954, todos do CPC.
[XV] Artigos 928, caput (“ações” possessórias) e 937 (nunciação de obra nova).
[XVI] CPC, artigo 920.

quinta-feira, 18 de março de 2010

T320 - Lançamento Tributário

TP320 – Lançamento: conceito e espécies

Notas Didáticas de Direito Tributário
Jorge Ferreira da Silva Filho
Professor de Direito Tributário e Processo Tributário do Centro Universitário do Leste Mineiro – UNILESTE
Mestre em Direito Público pela Universidade Gama Filho
Especialista em Direito Processual pela Escola Superior de Advocacia da OAB-MG.
Associado ao IAMG – Instituto dos Advogados de Minas Gerais

1. Lançamento – Propedêutica. O lançamento é um ato administrativo[I] fiscal complexo, praticado privativamente[II] pela autoridade administrativa competente, e sua função é a de constituir o crédito tributário, como se conclui da rasa leitura do art. 142 do CTN.[III] O lançamento válido implica que a autoridade fiscal: verifique a exata delimitação do fato gerador ocorrido; determine quais são os tributos incidentes sobre o fato gerador; calcule o montante do tributo a ser pago; identifique o sujeito passivo (contribuinte ou responsável); e defina, caso encontre uma infração às normas tributárias, a penalidade cabível. Ocorrido o fato gerador nasce a obrigação tributária e o dever de o sujeito passivo, definido em lei, pagar o tributo correspondente. Isso implica previamente produzir a certeza e a liquidez da obrigação. A certeza decorre da exata valoração jurídica do fato imponível. [IV] A liquidez se perfaz quando o valor em moeda do tributo fica determinado.

2. Meios de realização do pagamento do tributo. Em termos práticos, o legislador viabilizou duas possibilidades para o sujeito passivo pagar o tributo. Na primeira, o sujeito passivo deve ser notificado pelo fisco sobre o valor do tributo a ser pago e o termo final para o pagamento. No segundo, o próprio sujeito passivo calcula o valor do tributo e antecipa o pagamento, ou seja, paga sem que haja qualquer intervenção ou contato com a autoridade fiscal. São exemplos da primeira possibilidade os lançamentos denominados “ex officio” e por declaração, descritos, respectivamente, nos artigos 149 e 147 do CTN. A segunda via de realização do pagamento é a descrita no art. 150 do CTN – lançamento por homologação.

3. Lançamento por declaração – ou misto. O “procedimento”, descrito no art. 147 do CTN[V], implica duas etapas: uma declaração – confissão – do sujeito passivo ao Fisco, dizendo que ocorreu tal fato gerador; em seguida, o fisco determina quais são os tributos imponíveis em relação ao fato gerador – acertamento jurídico – e calcula o valor do tributo, tornando-o capaz de exigibilidade. São exemplos de tributos lançados por declaração: ITBI; Imposto de Importação; Imposto de Exportação [VI].

4. Lançamento de ofício – ex officio. Previsto no artigo 149 do CTN, este lançamento se realiza apenas com a intervenção da autoridade administrativa fiscal, sem participação do sujeito passivo. A autoridade fiscal deve agir se e apenas se existir lei específica autorizando essa modalidade de lançamento (caput e inciso I, do art. 149 do CTN). Importante observar que o art. 149 contém nove incisos, todavia, os incisos II a IX tratam da revisão do lançamento. Atualmente, essa modalidade de lançamento se restringe a pequena gama de tributos, tais como: IPVA, IPTU, as Taxas, Contribuições e Melhoria, Contribuições Corporativas e COSIP.[VII] Não se deve confundir lançamento de ofício com auto de infração. [VIII]

5. Lançamento por homologação. Esse procedimento, delineado no art. 150 do CTN, joga a responsabilidade pelo acertamento jurídico e pelo cálculo do valor do tributo ao próprio sujeito passivo, sem intervenção de qualquer autoridade fiscal. O pagamento do tributo deve ser feito sob responsabilidade do sujeito passivo. Posteriormente, a autoridade fiscal poderá examinar se o tributo foi calculado e recolhido conforme a legislação e cobrar as diferenças encontradas. São exemplos de tributos lançados por homologação: ICMS; IPI; IR; PIS e COFINS; Empréstimos Compulsórios[IX]. O enunciado do art. 150 do CTN contradiz o conceito legal de lançamento contido no art. 142. A doutrina faz severas críticas à sistemática desse tipo de lançamento. [X]

6. Natureza jurídica do lançamento. Não há uniformidade na doutrina[XI]. Alguns entendem que a natureza do lançamento é declaratória[XII]; outros dizem que o lançamento tem natureza meramente constitutiva[XIII]. Cassone percebe a natureza jurídica do lançamento como declaratória e constitutiva[XIV]. Alberto Xavier, percebendo as limitações das posições retro, construiu a teoria dos graus sucessivos de eficácia e desenvolveu o conceito de atendibilidade. [XV] A exigibilidade do crédito tributário dependeria da constituição deste, pelo lançamento, e do vencimento do prazo assinado para o pagamento. A atendibilidade resume-se no preenchimento de todas as circunstâncias capazes de permitir ao sujeito passivo pagar seu tributo e ao sujeito ativo receber tal pagamento. A referida teoria pode ser assim sintetizada: ocorrido o fato gerador nasce a obrigação tributária, todavia, apenas em tese, pois ela depende de acertamentos (valor; sujeito passivo; prazo de pagamento etc); com o lançamento, acerta-se a obrigação, nascendo o crédito – obrigação atendível; vencido o prazo de pagamento o credor pode exigir a obrigação, fazendo-o pela simples cobrança administrativa (notificação para pagar o principal mais a multa e correção); não efetivado o pagamento inscreve-se o devedor na DIVIDA ATIVA, extraindo-se a CDA – certidão de dívida ativa – título de crédito extrajudicial que torna a obrigação exequível.

[I] O artigo 142 do CTN, expressamente, define o lançamento como “procedimento”. Parte da doutrina entende que o “lançamento” é um ato administrativo. Por todos citamos: COSTA, Regina Helena. Curso de direito tributário, Constituição e Código Tributário Nacional. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 217.
[II] A doutrina critica essa redação. Explica Carlos da Rocha Guimarães, dizendo: “O que se pode concluir de todo esse exame do problema é que o Código Tributário Nacional partiu do princípio apriorístico, e portanto somente ideal, segundo o qual todo tributo deveria ser sacramentado por um ato de lançamento, quando tal premissa não corresponde a realidade” – apud Aurélio Pitanga Seixas Filho. Estudos de procedimento administrativo fiscal. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2000, p. 35.
[III] Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível. Parágrafo único. A atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigatória, sob pena de responsabilidade funcional.
[IV] Aurélio Pitanga Seixas Filho. Estudos de procedimento administrativo fiscal. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2000, p. 23.
[V] Art. 147. O lançamento é efetuado com base na declaração do sujeito passivo ou de terceiro, quando um ou outro, na forma da legislação tributária, presta à autoridade administrativa informações sobre matéria de fato, indispensáveis à sua efetivação.
Notas: O exemplo clássico era o imposto de renda – “lançamentos relativos ao imposto de renda de pessoa física e jurídica, em que elas têm de prestar informações ao fisco” (Martins, 195 ). 2ª) Luciano Amaro e Ricardo Lobo Torres observam que no imposto de renda de pessoas físicas e jurídicas o contribuinte declarava os rendimentos obtidos e realizava as deduções e abatimentos. Em seguida o fisco procedia com a “notificação do lançamento” .
[VI] SABBAG, Eduardo. Manual de direito tributário. 1. ed. 3ª tiragem. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 711.
[VII] SABBAG, Eduardo. Manual de direito tributário. 1. ed. 3ª tiragem. São Paulo: Saraiva, 2009, pp. 710 e 711.
[VIII] COSTA, Regina Helena. Curso de direito tributário, Constituição e Código Tributário Nacional. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 226.
[IX] SABBAG, Eduardo. Manual de direito tributário. 1. ed. 3ª tiragem. São Paulo: Saraiva, 2009, pp. 715 e 716.
[X] São “disposições arrevesadas de nosso direito positivo” ( LucianoAmaro); que é uma “construção artificiosa” ( Ricardo Lobo Torres); que se trata de uma ficção jurídica. Carlos da Rocha Guimarães pontua “ O que se pode concluir de todo esse exame do problema é que o CTN partiu do princípio apriorístico, e portanto somente ideal, segundo o qual todo tributo deveria ser sacramentado por um ato de lançamento, quando tal premissa não corresponde à realidade jurídica”. ... “Em conseqüência, no que se refere ao lançamento por homologação expressa ou tácita (decurso de prazo), partindo o legislador de base sem suporte dogmático, mostra-se ele supérfluo e mesmo prejudicial a uma sistemática jurídica, por tornar mais complexa a normação da figura do lançamento” – (Aurélio Pitanga Seixas Filho. Estudos de procedimento administrativo fiscal. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2000, p. 35 ).
[XI] “As diversas prescrições jurídicas são produzidas geralmente sem qualquer preocupação com o conhecimento do sistema no qual se encartam. E até sem compromisso com a univocidade e a precisão técnica dos termos que emprega em seu discurso, ficando sob a responsabilidade dos juristas ‘o trabalho de desvelar a significação destes’. ... O estudo das questões concernentes ao lançamento tributário bem demonstra tais dificuldades”. – Hugo de Brito Machado. Aspectos do lançamento tributário. In: Curso de Direito Tributário e Finanças Públicas. Eurico Marcos Diniz de Santi (coordenador). São Paulo: Saraiva, 2008, p. 830.
[XII] MARTINS, Sérgio Pinto. Manual de direito tributário. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 172.
[XIII] AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 336.
[XIV] CASSONE, Vittorio. Direito tributário. 20. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 180.
[XV] AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 337.

segunda-feira, 15 de março de 2010

T200 - Fontes do direito tributário

TP200 – Fontes do Direito Tributário

Notas Didáticas de Direito Tributário
Jorge Ferreira da Silva Filho
Professor de Direito Tributário e Processo Tributário do Centro Universitário do Leste Mineiro – UNILESTE
Mestre em Direito Público pela Universidade Gama Filho
Especialista em Direito Processual pela Escola Superior de Advocacia da OAB-MG.
Associado ao IAMG – Instituto dos Advogados de Minas Gerais

1. A importância do conceito de “fonte” no Direito Tributário. A palavra fonte é associada à idéia de lugar onde a água brota (jorra, provém etc.). No Direito, fonte significa a causa[I] que faz nascer a regra obrigatória de conduta. Há, pois, duas espécies de fontes: 1ª) materiais – que dizem respeito aos fatos econômicos, políticos, sociológicos e morais[II] que respondem como causa (motivação) para a produção da norma jurídica; 2ª) formais – modo ou meio pelo qual o direito se expressa; se comunica. Vários autores definem as fontes formais do direito tributário, simplesmente como “meios de expressão” ou “modos de expressão do direito” [III] – costumes, leis, jurisprudência etc. Considerando que o objeto principal do Direito Tributário é o instituto denominado “tributo” e, tendo este, por força da Constituição Federal, validade jurídica se, e somente se, nascer da lei (art. 3º do CTN c/c art. 150, I e 5º, II da CF) apresenta-se como importantíssimo o estudo dessa fonte formal. As fontes formais no direito tributário brasileiro equivalem ao que o Código Tributário Nacional definiu para a expressão “legislação tributária” no seu artigo 96.[IV] As fontes formais primárias são: a Constituição Federal; as emendas à Constituição, as leis complementares; as leis ordinárias; as leis delegadas; as medidas provisórias, os decretos legislativos, as resoluções (art. 59 da CF)[V]. As fontes formais secundárias são: os decretos, os regulamentos, as instruções ministeriais, as circulares, as ordens de serviço, as instruções normativas, as portarias etc. [VI]

2. O significado da palavra lei no contexto jurídico-tributário. A palavra lei, encontrada no art. 3º do CTN e no art. 150, I da CF, tem sentido lato, ou seja, amplo. Isso significa que a palavra lei deve ser entendida como espécies do processo legislativo[VII], abrangendo: a própria Constituição Federal, as emendas à Constituição, as leis complementares, as leis ordinárias, as medidas provisórias, as leis delegadas etc. As resoluções, os decretos executivos, as portarias e demais normas jurídicas infralegais não têm a capacidade de criar o tributo, mas podem regular e determinar outros efeitos. Todas essas produções normativas inserem-se no conceito de legislação tributária. A lei criadora de tributos, denominada pela doutrina lei tributária, tem características especiais ressaltadas no art. 97 do CTN. [VIII] São marcas que diferenciam a lei tributária de outras leis. Assim, a instituição, a extinção, a majoração, a redução, a definição do fato gerador, a fixação da alíquota, a base de cálculo, a cominação de penalidades por infrações às normas tributárias, as hipótese de exclusão, os casos de suspensão de exigibilidade do crédito tributário, a extinção ou dispensa deste, se dão pela via da lei tributária. Alguns tributos podem, excepcionalmente, ter alíquotas alteradas por mero Decreto, mas se afiguram exceções previstas no bojo da própria Constituição. [IX]

3. Características das fontes formais primárias.
3.1 Constituição Federal. Essa é a fonte formal mais importante. Encontra-se no ápice do ordenamento jurídico. Orienta a produção legislativa e fulmina qualquer ato “emanado do Poder Público que vulnerar formal ou materialmente, os preceitos e princípios inscritos no documento constitucional”. [X] A Constituição não cria tributos. Ela apenas dá o poder – competência – às pessoas jurídicas de direito público interno para instituir determinados tributos. [XI]
3.2 Emendas à Constituição. As emendas à Constituição vêm sendo usadas para criar ou alterar dispositivos constitucionais que versam sobre matéria tributária. [XII] A emenda à Constituição é ato do Poder Constituinte Derivado. Portanto, o enunciado da emenda, para ser validamente incorporado à Constituição, deve respeitar os limites traçados pelo Constituinte Originário (ADIN 939-7, DF). Este cuidado parece não ter existido na produção das Emendas Constitucionais de números 29, 33, 39 e 42, uma vez que deflagraram intensa discussão doutrinária e jurisprudencial. [XIII]
3.3 Lei Complementar. A lei complementar goza de especial importância para o direito tributário, pois somente por este instrumento legislativo é que se pode: 1º) dispor sobre os conflitos de competência, em matéria tributária, entre as entidades federativas; 2º) regulamentar as disposições constitucionais que limitam o poder de tributar; 3º) estabelecer normas de caráter geral sobre matéria tributária (art. 146 da CF). Há, pois, uma tríplice função dada à lei complementar. [XIV] Além das funções retro explicadas, a lei complementar é o único veículo possível de ser utilizado para instituir os seguintes tributos: Imposto sobre as grandes fortunas (CF, 153, VII); empréstimos compulsórios (CF, 148); impostos residuais (CF 154, I); contribuições sociais residuais (art. 195, §4º). O grau de dificuldade para aprovação de uma lei complementar justifica as reservas de função e de capacidade de instituição dos tributos mencionados. Importantíssimo observar que o Código Tributário Nacional é a lei complementar basilar do nosso sistema tributário. Originariamente, este corpo normativo tributário foi criado como mera lei ordinária (Lei 5172 / 1966), pois não havia nesta época a figura da lei complementar. [XV]. Desde 1967, quando a Constituição da época passou a exigir lei complementar para regular matéria tributária, o Código Tributário Nacional passou a ser modificado apenas por lei complementar. [XVI] O Supremo Tribunal Federal entende que a Constituição Federal de 1988 recepcionou o CTN como lei complementar.
3.4 Lei Ordinária. Excetuando os poucos impostos e as contribuições que somente podem ser instituídos por lei complementar, é à lei ordinária que se reservou a aptidão para instituir todos os demais tributos e em quaisquer das esferas de poder (federal, estadual, municipal).[XVII]
3.5 Lei Delegada. As leis delegadas, previstas no art. 68 da CF, podem ser empregadas em matéria tributária, inclusive para instituir tributos, uma vez que essa aplicação não se encontra relacionada no campo das vedações a sua utilização. Quem as elabora é o Presidente da República, porém, este, pouco as utiliza, porque dispõe de um mecanismo mais prático: as medidas provisórias.
3.6 Medida Provisória. As medidas provisórias, previstas no art. 62 da Constituição Federal, com a concordância do Congresso e dos Tribunais, têm sido utilizadas para legislar sobre matéria de natureza tributária, quando o normal seria a via da lei ordinária. [XVIII] O parágrafo 2º do art. 62 da CF deixa explícita a capacidade de a medida provisória instituir ou majorar impostos.
3.7 Decreto Legislativo. Não se deve confundir o decreto legislativo com o instrumento de regulamentação das leis, privativo do chefe do executivo (Presidente de República, governadores e prefeitos), que é o mero decreto, ou decreto executivo. Previsto no art. 49, I da Constituição Federal, o decreto legislativo tem importância no direito tributário porque é ele o meio pelo qual se aprova um tratado internacional. [XIX]
3.8 Resoluções. Instrumento nomeado no inciso VII, do art. 62 da CF. São produzidos no Congresso Nacional e seus efeitos não dependem da sanção do Presidente da República. O principal uso das resoluções no campo tributário concentra-se na limitação de alíquotas de impostos estaduais, conforme previstos no art. 155, §1º, IV e §2º, IV e V.

4. Os tratados e convenções internacionais. Com a globalização, os tratados internacionais em matéria tributária passaram desfrutar de intensa presença no cenário brasileiro. No campo em estudo não é importante diferençar tratado de convenção. Ambos são instrumentos celebrados pelo Presidente da República (CF 84, VIII) que entram no ordenamento jurídico brasileiro depois de referendados pelo Congresso Nacional, por meio do Decreto Legislativo. [XX] Discute-se muito se a superveniência de lei tributária nacional teria a capacidade de revogar a disposição internacional. Uma das fontes que alimenta a discussão reside no enunciado do art. 98 do CTN. A posição dominante sobre o tema é no sentido de que haverá uma coexistência entre a lei interna e o tratado inserido no ordenamento jurídico brasileiro. Tal convivência se aperfeiçoa por meio da aplicação do Princípio da Especialidade, pois os tratados são considerados leis especiais, ou seja, de aplicação ao restrito campo legiferado (Cf. REsp 196.560). Exemplificando: Se há um tratado no qual se convencionou não aplicar o IPI sobre produtos norte-americanos, na superveniência de lei nacional mandando incidir o IPI sobre produtos estrangeiros, esta não se aplicará ao produto originado dos Estados Unidos da América. [XXI]

[I] MORAES, Bernardo Ribeiro de. Compêndio de direito tributário. v.2. 3a ed., Rev., aumentada e atualizada. –Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 4.
[II] Idem, p. 6.
[III] AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 165. SABBAG, Eduardo. Manual de direito tributário. 1. ed. 3ª tiragem. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 509.
[IV] Art. 96. A expressão "legislação tributária" compreende as leis, os tratados e as convenções internacionais, os decretos e as normas complementares que versem, no todo ou em parte, sobre tributos e relações jurídicas a eles pertinentes.
[V] CASSONE, Vittorio. Direito tributário. 20. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 23.
[VI] Cassone, Vittorio. Direito tributário. 20. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 36.
[VII] Art. 59 da Constituição Federal.
[VIII] Art. 97. Somente a lei pode estabelecer: I - a instituição de tributos, ou a sua extinção; II - a majoração de tributos, ou sua redução, ressalvado o disposto nos artigos 21, 26, 39, 57 e 65; III - a definição do fato gerador da obrigação tributária principal, ressalvado o disposto no inciso I do § 3º do artigo 52, e do seu sujeito passivo; IV - a fixação de alíquota do tributo e da sua base de cálculo, ressalvado o disposto nos artigos 21, 26, 39, 57 e 65; V - a cominação de penalidades para as ações ou omissões contrárias a seus dispositivos, ou para outras infrações nela definidas; VI - as hipóteses de exclusão, suspensão e extinção de créditos tributários, ou de dispensa ou redução de penalidades. § 1º Equipara-se à majoração do tributo a modificação da sua base de cálculo, que importe em torná-lo mais oneroso. § 2º Não constitui majoração de tributo, para os fins do disposto no inciso II deste artigo, a atualização do valor monetário da respectiva base de cálculo.
[IX] Impostos sobre importação, exportação, produtos industrializados, operações de crédito, câmbio e seguro ou relativos a títulos ou valores mobiliários (CF art. 153, §1º).
[X] Ministro Celso de Mello; Cf. ADIN 42-0 DF; apud CASSONE, Vittorio. Direito tributário. 20. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 24.
[XI] AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 167.
[XII] V.g.: EC 3, de 17/3/1993; EC 39, de 19/12/2002.
[XIII] SABBAG, Eduardo. Manual de direito tributário. 1. ed. 3ª tiragem. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 518.
[XIV] SABBAG, Eduardo. Manual de direito tributário. 1. ed. 3ª tiragem. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 547.
[XV] MARTINS, Sérgio Pinto. Manual de direito tributário. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 30.
[XVI] AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 171.
[XVII] CASSONE, Vittorio. Direito tributário. 20. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 27.
[XVIII] AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 165.
[XIX] AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 190.
[XX] SABBAG, Eduardo. Manual de direito tributário. 1. ed. 3ª tiragem. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 534.
[XXI] Idem, p. 538.

quarta-feira, 10 de março de 2010

P200 Processo Cautelar - introdução



Jorge Ferreira da Silva Filho
Professor de Direito Processual Civil do Centro Universitário do Leste Mineiro – UNILESTE
Mestre em Direito Público pela Universidade Gama Filho
Integrante do IAMG – Instituto dos Advogados de Minas Gerais
Especialista em Direito Processual pela Escola Superior de Advocacia da OAB-MG

OBSERVAÇÃO: TEXTO SEM REVISÃO GRAMATICAL

1. A Função do Processo Cautelar. As pessoas, no Estado moderno, com raríssimas exceções, precisam da intervenção do Poder Judiciário para buscar o reconhecimento ou a satisfação de direitos que entendem ser titulares. Tendo ou não tendo a razão que a pessoa pensa que tem, a ela assistirá sempre o direito de provocar o Poder Judiciário – direito ou poder de ação – para tentar: 1º) condenar alguém a uma prestação; 2º) constituir uma nova situação ou relação jurídica; 3º) conseguir uma declaração judicial, de seu particular interesse, versando sobre a existência ou inexistência de particular relação jurídica; 4º) obter a satisfação concreta de um direito, já reconhecido pelo Estado. O meio pelo qual o Estado e as pessoas utilizam para o exercício do direito de ação é o processo. [I] Para essas três primeiras finalidades – condenatória constitutiva e declaratória – utiliza-se o processo de conhecimento. Para a quarta finalidade emprega-se o processo de execução. No processo de execução em que se busca receber quantia certa, nenhuma utilidade terá o processo se, ao final, nenhum bem do devedor for encontrado para ser levado à praça. Da mesma forma, de nada adiantará alguém ser condenado a entregar uma coisa a outrem, se, ao final do processo de conhecimento, nada restar desta coisa ou esta se encontrar deteriorada. Daí nasceu a necessidade de se criar um outro meio com a finalidade de proteger, aqui e agora, a utilidade futura dos processos de conhecimento ou de execução: trata-se do Processo Cautelar . Neste, a pessoa se dirige ao Poder Judiciário para buscar a determinação judicial de efetivação de uma medida apta a proteger a utilidade de outro processo: trata-se da medida cautelar. Portanto, a medida cautelar é o pedido que se faz na petição inicial de um processo cautelar. No mundo real forense, advogados, juízes e promotores não observam este rigor terminológico e aplicam as expressões “medida cautelar”, “processo cautelar” e “ação cautelar” como sinônimos. [II]

2. Requisitos elementares para a concessão de uma medida cautelar. Concebido para proteger a utilidade final de um processo cognitivo ou executório, o processo cautelar tem por objeto a concessão de uma medida idônea a evitar que uma pessoa venha a sofrer lesão em seu direito buscado no processo principal. A Constituição Federal autoriza que o Judiciário seja provocado para agir em casos em que haja simples ameaça de lesão a um direito (Art. 5º, inciso XXXV da CF). Quando se requer uma medida cautelar, nem a parte nem o juiz sabem se o pedido do autor será julgado procedente. Quer-se, proteger, com a medida cautelar, os efeitos jurídicos desejados para a hipótese de procedência do pedido no processo principal. Para isso, o juiz examina os fatos afirmados, na inicial da ação cautelar, e destes deve extrair uma convicção: a de que existe uma razoável probabilidade de o autor ter o direito que afirma ter. Trata-se do fumus boni iuris, ou a fumaça do bom direito. Mas isso não basta para a concessão da medida cautelar. É necessário também demonstrar ao julgador que surgiram circunstâncias capazes de colocar em razoável risco de perecimento, os bens jurídicos relacionados diretamente com a satisfação do direito pleiteado na ação principal. Trata-se do periculum in mora. É a probabilidade de dano que possa resultar a uma das partes da ação principal, caso não se tome uma medida preventiva (acautelatória) antes do ajuizamento da ação principal ou no curso desta. [III] O legislador expressamente autoriza o juiz, por meio do art. 798 do CPC, a determinar as medidas acautelatórias adequadas.

3. O objeto do processo cautelar. No processo cautelar, o requerente dirige-se ao juiz e pede que este lhe conceda uma medida – a medida cautelar. Essa consiste no pedido, ou objeto, do processo cautelar. Para que o requerente tenha sucesso na ação, ele deve formular seu pedido, de forma que o juízo se convença de que a concessão da medida pleiteada tenha a real e concreta capacidade – aptidão – para proteger a utilidade do processo de execução ou de conhecimento, quando estes chegarem ao final. Importante ressaltar que o pedido no processo cautelar não pode se confundir com o objeto do processo principal. Se o pedido formulado no processo, pensado como cautelar, se aproximar ou for idêntico ao pedido do processo principal, estar-se-á diante de antecipação da tutela ou de seus efeitos. O processo não terá natureza cautelar. Poderá ter procedimento similar ao que se utilizada para o processo cautelar, mas não será cautelar, pois não há “cautelar satisfativa”;[IV] ou a medida acautela – protege – ou, então, satisfaz.

4. Características do Processo Cautelar. O processo cautelar existe para proteger a utilidade do processo principal – Execução ou Conhecimento. Extinguindo-se o processo principal, não haverá mais processo a proteger. Por isso, extinguindo-se o processo principal extingue-se o processo cautelar àquele relacionado. Essa característica se denomina acessoriedade, enunciada na parte final do art. 797 do CPC. A segunda característica é a autonomia,[V] que não deve ser confundida com a acessoriedade. Diz-se que o processo cautelar é autônomo porque o resultado alcançado no processo cautelar – procedência ou improcedência do pedido – não interfere no resultado do principal. A exceção à regra diz respeito ao acolhimento pelo juiz, no procedimento cautelar, a alegação de decadência ou prescrição da pretensão relativa ao direito do autor – art. 810 do CPC. A terceira característica reside na forma tramitação do processo cautelar, pois os autos correm em apenso – art. 809, do CPC.

5. Características da medida cautelar. No tocante à medida cautelar, a doutrina aponta as seguintes características: a instrumentalidade hipotética[VI]; a temporariedade[VII], ou provisoriedade[VIII]; a revogabilidade[IX]; a modificabilidade; a fungibilidade[X]; a referibilidade[XI]; a autonomia[XII]. Algumas dessas características estão contidas nos enunciados dos artigos do CPC, tais cmo: Revogabilidade (CPC 807); Modificabilidade (CPC 807); Temporariedade (CPC 808); Fungibilidade (CPC 805). Diz-se que a instrumentalidade é hipotética porque não se sabe se o pedido do autor da ação principal será julgado procedente; poderá ou não ter sucesso na ação principal. Diz-se que a medida cautelar é temporária[XIII] porque ao final de sua existência ela não será substituída por nenhuma outra medida definitiva. Ela se extingue assim que não houver mais a necessidade de proteger a utilidade do processo principal, conforme se constata da leitura do art. 808 do CPC. Alguns autores não identificam a temporariedade como característica, mas, sim, a provisoriedade. [XIV] A medida cautelar é revogável a qualquer tempo, por expressa previsão legal (CPC 807). Cessando-se as razões de sua existência, a medida cautelar deve ser revogada. A medida cautelar pode ser modificada pelo juiz, de forma a manter sua eficácia diante das alterações nas circunstâncias que influenciaram no seu deferimento. Trata-se da modificabilidade, característica que se encontra também prevista no art. 807 do CPC. A fungibilidade é outra marca da medida cautelar. Diz que esta é fungível porque pode ser substituída por uma garantia [caução] menos gravosa para o requerido – art. 805 do CPC. [XV] No tocante à referibilidade, tem-se que, via de regra, a medida cautelar requerida no processo cautelar está referida a uma ação principal. Por fim, se afirma que a medida cautelar goza de autonomia dentro do processo, porque seu deferimento ou indeferimento pelo juiz, não impede que autor prossiga com o processo principal nem interfere no resultado deste. Em outras palavras: a medida cautelar pode ser indeferida e o autor sair vitorioso no processo principal – e vice-versa.

6. As medidas cautelares inominadas e as específicas. A repetição de certos comportamentos humanos e, também de algumas circunstâncias na relação credor / devedor de quantia certa, levou o legislador a catalogar hipóteses que, por presunção, configuram o periculum in mora e o fumus boni iuris. [XVI] Para essas situações que se repetem o legislador criou medidas cautelares específicas com procedimentos também específicos. O legislador deu nome a cada uma destas medidas cautelares, todavia as organizou sob a rubrica “Procedimentos Cautelares Específicos”. São exemplos: O arresto (CPC 813 e ss.), o sequestro (CPC 822 e ss.), o arrolamento etc. Assim, quando o legislador diz que o juiz, perante o credor que exibe prova literal de dívida líquida e certa (CPC 814, I) – fumus boni iuris – contra devedor que, sem domicílio certo, aliena bens que possui – (CPC 814, II c/c 813); periculum in mora – pode ordenar a apreensão material de patrimônio do responsável, está, simplesmente, dizendo que essa hipótese de tanto repetir no mundo dos fatos merece uma atuação judicial padronizada quanto à medida cautelar e quanto ao procedimento. No caso, temos o arresto – Artigos 813 a 821 do CPC. A vida, porém, é muito mais rica e cheia de alternativas, do que possa prever o legislador. Por isso, foi deixada em aberto a possibilidade de se criar medidas cautelares adequadas a hipótese não previstas pelo legislador. São as cautelares inominadas, expressamente autorizadas no artigo 798 do CPC. Daí decorre o Poder Geral de Cautela, poder-dever dado ao juiz pelo legislador.

7. A questão da acessoriedade do “procedimento” cautelar. O artigo 796 do CPC deve ser lido com reservas, pois nem todo procedimento de natureza cautelar depende a existência de um processo principal. É o caso da ação de dano infecto fundada no permissivo dos artigos 1.280 e 1.281 do Código Civil. Portanto, uma interpretação mais cuidadosa do enunciado do artigo 796 do CPC leva ao posicionamento no sentido de que “o procedimento cautelar é, em regra, dependente do procedimento principal”.[XVII]

NOTAS
[I] SANTOS, Ernane Fidélis dos. Manual de direito processual civil. Vol. 2. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 286.
[II] Explica Misael Montenegro Filho: “É que na dinâmica forense utilizamos as expressões ação cautelar, processo cautelar e medida cautelar sem um critério jurídico mais refinado, posição assumida não apenas pelos advogados, como também pelos próprios magistrados, seja na prolação de decisões interlocut´rias seja no julgamento final do processo, através da sentença” – Cf. Curso de direito processual civil: Medidas de urgência; tutela antecipada e Ação cautelar; procedimentos especiais. V. 3. 5. ed. –São Paulo: Atlas, 2009, p. 47
[III] GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro, volume 3: Processo de execução a procedimentos especiais).  20. ed. rev . e atual.  São Paulo: Saraiva, 2009, p. 169.
[IV] “A expressão [cautelar satisfativa], evidentemente é imprópria, pois a tutela cautelar é instrumental à pleiteada em outra ação (principal), não podendo ser satisfativa” – Cf. MEDINA, José Miguel Garcia et al. Procedimentos cautelares e especiais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. – (Processo civil moderno; v. 4), p. 28.
[V] DONIZETTI, Elpídeo. Curso didático de direito processual civil. 7. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2007, p. 775. Paulo Afonso Garrido de Paula ensina: “A autonomia ou identidade própria do processo cautelar decorre do fato de encerrar uma relação processual distinta, diversa daquela estabelecida no processo principal” – in: MARCATO, Antônio Carlos (coordenador). Código de processo civil interpretado. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2008, p. 2475.
[VI] MONTENEGRO FILHO, Misael. Curso de direito processual civil: Medidas de urgência; tutela antecipada e Ação cautelar; procedimentos especiais. V. 3. 5. ed. –São Paulo: Atlas, 2009, p. 56. CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. vol. III. 12. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, p. 22.
[VII] CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. vol. III. 12. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, p. 23.
[VIII] DONIZETTI, Elpídio. Curso didático de direito processual civil. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 1.087. MONTENEGRO FILHO, Misael. Curso de direito processual civil: Medidas de urgência; tutela antecipada e Ação cautelar; procedimentos especiais. V. 3. 5. ed. –São Paulo: Atlas, 2009, p. 56.
[IX] MONTENEGRO FILHO, Misael. Curso de direito processual civil: Medidas de urgência; tutela antecipada e Ação cautelar; procedimentos especiais. V. 3. 5. ed. –São Paulo: Atlas, 2009, p. 57. THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil: processo de execução - processo cautelar. Vol. II. 41. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2007, p.542.
[X] CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. vol. III. 12. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, p. 28. MONTENEGRO FILHO, Misael. Curso de direito processual civil: Medidas de urgência; tutela antecipada e Ação cautelar; procedimentos especiais. V. 3. 5. ed. –São Paulo: Atlas, 2009, p. 56.
[XI] CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. vol. III. 12. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, p. 23.
[XII] DONIZETTI, Elpídio. Curso didático de direito processual civil. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 1.088.
[XIII] CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. vol. III. 12. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, p. 23.
[XIV] DONIZETTI, Elpídeo. Curso didático de direito processual civil. 7. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2007, p. 775. THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil: processo de execução - processo cautelar. Vol. II. 41. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 541.
[XV] Paulo Afonso Garrido de Paula. In: MARCATO, Antônio Carlos (coordenador). Código de processo civil interpretado. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2008, p. 2501.
[XVI] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil: processo de execução - processo cautelar. Vol. II. 41. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 625.
[XVII] MARINONI, Luiz Guilherme. MITIDIERO, Daniel. Código de processo civil comentado artigo por artigo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 791.

sábado, 6 de março de 2010

Tributação - Noções Elementares


T001 - Tributação – Noções Elementares

Autor: Jorge Ferreira da Silva Filho.

Professor de Direito Tributário do Centro Universitário do Leste Mineiro - UNILESTE.

Mestre em Direito Público pela Universidade Gama Filho - Rio de Janeiro

Pós-Graduado em Direito Processual pela Escola Superior de Advocacia da OAB/MG

E-mail: professorjorge1@hotmail.com


1. A atividade financeira do Estado e a importância do tributo.

Uma das precípuas funções do Estado é a prestação de serviços públicos. Tal prestação exige recursos humanos e materiais. Isso implica que o Estado precisa e deve conseguir dinheiro para pagar por estes recursos. Denomina-se atividade financeira do Estado o conjunto de atos consistente em “obter, criar, gerir e despender o dinheiro indispensável às necessidades, cuja satisfação o Estado assumiu ou cometeu àqueloutras pessoas de direito público”. [i] O Estado, portanto, obrigou-se à execução de despesas e com a obtenção de recursos financeiros (receitas) para fazer frente a essas despesas. Por isso se diz que é inerente ao Estado o seu Poder Fiscal.

A Receita é “a soma de dinheiro percebida pelo Estado para fazer face à realização dos gastos públicos”.[ii] O art. 11 da Lei 4.320/64 prevê duas categorias de receitas: As Receitas Correntes (Receita Tributária, Transferências Correntes); As Receitas de Capital (Operações de crédito, alienação de bens etc). A doutrina classifica as Receitas em duas categorias: as originárias; e as derivadas.[iii] As receitas derivadas são as importâncias em dinheiro que o Estado, amparado em Lei, toma do patrimônio (riqueza) do particular. Dentre as receitas derivadas destaca-se o tributo, assim definido pelo legislador na Lei 4.320/64: Art. 9º Tributo e a receita derivada instituída pelas entidades de direito publico, compreendendo os impostos, as taxas e contribuições nos termos da constituição e das leis vigentes em matéria financeira, destinado-se o seu produto ao custeio de atividades gerais ou especificas exercidas por essas entidades (Veto rejeitado no D.O. 05/05/1964). (Grifo do autor)

No ano de 2009, a Receita Federal do Brasil arrecadou R$ 698.289 milhões. Deste total R$ 457.150 milhões são derivados dos impostos e contribuições, ou seja, dos tributos [iv]. Daí a importância do estudo do fenômeno tributário, pois ele é a maior fonte das receitas do Estado.

2. O tributo – noções elementares.

Como passo inicial, se deve traçar as primeiras noções sobre a idéia do “tributo”. A Constituição Federal determina que cabe à lei complementar estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, e, especialmente, sobre a definição de tributos e suas espécies (CF 146, III, “a”). Em 1988, quando foi promulgada nossa Constituição, vigorava a Lei 5.172, de 25-10-1966, que dispunha sobre o Sistema Tributário Nacional e instituía normas gerais de direito tributário. Em 1966 não havia previsão constitucional para a “lei complementar”. Essa categoria de lei surgiu na Constituição de 1967. A lei retro foi então recepcionada pela Carta de 1967, com status de “lei complementar”, e recebeu a denominação “Código Tributário Nacional” – CTN. O Supremo Tribunal Federal reconheceu o CTN como lei complementar, no RE 93850-MG. Posição mantida depois de promulgada a Constituição de 1988.[v] Portanto, é no CTN que se deve buscar a definição, ou melhor, o significado da palavra “tributo” no contexto jurídico tributário.
O CTN define o tributo no art. 3º, enunciando que: Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada. A redação desse dispositivo é criticada sobre vários aspectos, [vi] porém é possível extrair desse enunciado as idéias centrais do conceito de tributo. São elas: O tributo é uma obrigação, cujo objeto é uma prestação pecuniária (dar quantia certa); trata-se de uma obrigação sempre instituída por uma lei, ou seja, não se admite a forma contratual como fonte da obrigação (prestação da categoria ex lege e não ex voluntae); o caráter da obrigação não pode ser sancionatório. O artigo 4º do CTN enuncia importante característica do tributo, dizendo que a natureza de cada tributo não decorre de sua denominação, mas de seu “fato gerador”. Este conceito será explanado abaixo.

3. Conceito de “Tributo”. Em linguagem simples, se pode dizer que o tributo é uma categoria de prestação pecuniária, caracterizada pelo fato de ser instituída por lei e na conformidade da lei, que decorre do fato de o devedor ter praticado uma atividade lícita definida em lei como fato gerador da obrigação cujo credor é o Estado ou entidade não estatal cuja finalidade circunscreve-se a um interesse público. Tal definição alinha-se com a maioria da doutrina. [vii]

4. A linguagem básica para estudo inicial do Direito Tributário

Quando o aluno faz a primeira leitura dos artigos 146 e 149 da Constituição Federal, ele se depara com o emprego das seguintes palavras e expressões: fatos geradores; bases de cálculo; obrigação tributária, lançamento tributário; alíquotas. Para o melhor aproveitamento do texto constitucional é recomendável que o aluno assimile as primeiras noções sobre os institutos denominados: obrigação tributária; fato gerador; base de cálculo; alíquotas. Posteriormente, cada um destes institutos será estudado com maior profundidade.

A obrigação tributária, como a obrigação civil, tem como elementos os sujeitos – ativo e passivo –, o vínculo jurídico, e o objeto. Mas há significativas peculiaridades naquela. A obrigação tributária tem uma particular dicotomia, pois ela pode ser uma obrigação tributária principal ou uma obrigação tributária acessória (CTN 133, §§ 1º e 2º). No contexto do direito tributário não se aplica a noção civil de acessoriedade, contido no art. 92 do Código Civil. O objeto da obrigação tributária principal é uma prestação de dar quantia certa – prestação pecuniária. O objeto da obrigação tributária acessória é prestação de fazer. O sujeito ativo (o credor) e o sujeito passivo (quem deve pagar o tributo) devem ser definidos em lei. O vínculo jurídico tem duas facetas: a válida expectativa do sujeito ativo de receber a prestação pecuniária do devedor (Schuld); o poder de sujeitar o patrimônio do devedor, caso este não entregue espontaneamente a sua prestação (Haftung – ou responsabilidade). [viii] A obrigação tributária tem como fonte apenas a lei.

O fato gerador é o elemento que faz nascer a obrigação tributária (CTN 133, §1º). O fato gerador surge mediante a conjugação de dois fatores: uma lei que determine as hipóteses fáticas abstratas para a incidência do tributo; uma ocorrência – física ou jurídica – cuja descrição se amolde ao enunciado nas hipóteses de incidência. Exemplo: A hipótese de incidência do tributo denominado imposto de renda é a renda (aumento patrimonial). O recebimento de um salário (fato físico que ocorre no espaço e no tempo) configura um fato gerador para o imposto de renda.

O valor do tributo, ou seja, a quantidade de dinheiro a ser paga, é o que mais importa para os sujeitos da relação jurídica tributária. Por isso se torna primordial saber como se calcula este valor.

A forma de cálculo do valor de um tributo deve sempre ser buscada na lei, porém se pode afirmar que, independentemente da espécie de tributo, seu valor será uma função matemática, cujas variáveis são: a “base de cálculo”; e a “alíquota”. Isso significa que, para se determinar o valor do tributo, necessariamente, é preciso identificar na lei, a base de cálculo e a alíquota aplicável a cada tributo.

Esquema:

Valor do tributo = f ( BC , ALQ). BC= base de cálculo; ALQ= Alíquota. Obs: f = função.

A base de cálculo é uma grandeza (Exemplos: O valor, em dinheiro, da venda registrado na nota fiscal; Quantidade – toneladas, metros – ; unidade de coisa ou serviço).

A alíquota é um fator matemático (percentual; específico; ou constante) que será aplicado sobre a base de cálculo de forma que se apure o valor do tributo.

As alíquotas são assim classificadas: ad valorem; específicas; fixas. A Constituição Federal, no art. 149, §2º, inciso III, alíneas “a” e “b”, menciona expressamente as duas primeiras espécies de alíquotas.

A alíquota, quando expressa em percentual, se diz ad valorem. Quando a alíquota se expressa na forma razão – R$/tonelada – ela se diz específica. Às vezes a alíquota incidirá sobre um evento e implicará um valor fixo do tributo para cada evento. Neste caso, a alíquota se diz fixa. [ix]
Referências.

[i] BALEEIRO, Aliomar. Uma introdução à ciência das finanças. 15a ed. Rev. E atual. Por Dejalma de Campos. –Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 4.
[ii] TORRES, Ricardo Lobo. Curso de direito financeiro e tributário. 9ed. rev., atual. até EC no 33 e LC 113 de 19.09.91. –xxx. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 165.
[iii] SABBAG, Eduardo. Manual de direito tributário. 1. ed. 3ª tiragem. São Paulo: Saraiva, 2009, p.6.
[iv] http://www.receita.fazenda.gov.br/Publico/arre/2009/Analisemensaldez09.pdf
[v] CASSONE, Vittorio. Direito tributário. 20. ed. São Paulo: Atlas, 2009. , p. 13. MARTINS, Sérgio Pinto. Manual de direito tributário. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 30.
[vi] A palavra toda é desnecessária, por uma questão de lógica; a palavra moeda é redundante, pois a prestação é qualificada como pecuniária e isso significa entregar quantia em dinheiro – moeda; não faz sentido a expressão “ ou cujo valor nela se possa exprimir”, pois se estaria admitindo a possibilidade de pagamento in natura ou in labore, hipótese rejeitada pela maioria da doutrina (AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 20); Amaro, 20); o adjetivo compulsória é supérfluo, pois, toda prestação [objeto da obrigação] é compulsória (Amaro 21); pelo princípio da supremacia do interesse público poderia ser omitida a parte final do artigo.
[vii] Tributo é a prestação pecuniária não sancionatória de ato ilícito, instituída em lei e devida ao Estado ou a entidades não estatais de fins de interesse público (AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 25. Tributo pode ser conceituado como um ônus instituído pelo Estado, com base no seu poder fiscal, definido em lei, exigido compulsoriamente das pessoas que vivem em seu território, a fim de pode desenvolver suas atividades na busca de suas finalidades (MORAES, Bernardo Ribeiro de. Compêndio de direito tributário. v.2. 3a ed., Rev., aumentada e atualizada. –Rio de Janeiro: Forense, 2002. pp. 351/352).
[viii] GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. Direito civil: obrigações. São Paulo: Atlas, 2008, p. 30.
[ix] Exemplos: A Lei Estadual de Minas Gerais Nº 14.941, DE 29 DE DEZEMBRO DE 2003, que trata do imposto sobre a transmissão causa mortis e doação, diz que: Art. 4º A base de cálculo do imposto é o valor venal do bem ou direito recebido em virtude de sucessão legítima ou testamentária ou de doação, expresso em moeda corrente nacional e em seu equivalente em Ufemg. ... Art. 10. O imposto será calculado aplicando-se a alíquota de 5% (cinco por cento) sobre o valor total fixado para a base de cálculo dos bens e direitos recebidos em doação ou em face de transmissão causa mortis. No caso, a base de cálculo é o valor venal do bem. A alíquota é da categoria ad valorem. Na importação de produtos estrangeiros, determina a Lei Nº 3.244, DE 14 DE AGOSTO DE 1957: Art.1º - Está sujeita ao imposto de importação a mercadoria estrangeira que entrar em território nacional. Art.2º - O Imposto sobre a Importação será cobrado na forma estabelecida por esta Lei e pela Tarifa Aduaneira do Brasil, por meio de alíquota "ad valorem" ou específica, ou pela conjugação de ambas. (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 2.434, de 19/05/1988). Parágrafo único. A alíquota específica poderá ser determinada em moeda nacional ou estrangeira, podendo ser alterada de acordo com o disposto no Art.3º, modificado pelo Art.5º do Decreto-Lei nº 63, de 21 de novembro de 1966, e pelo Art.1º do Decreto-Lei nº 2.162, de 19 de setembro de 1984. (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 2.434, de 19/05/1988).