A USIMINAS, O
MASSACRE E A POLÍCIA MILITAR
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Artigo
publicado no jornal Diário do Aço – edição de 20/10/2013, página 2
Confesso que a
Audiência Pública, realizada na Câmara Municipal de Ipatinga, capitaneada pela
vereadora Lene Teixeira, instigou-me a aquilatar até que ponto a Polícia
Militar de Minas Gerais e a USIMINAS poderiam ser responsabilizadas pelas
mortes dos operários.
As opiniões,
os posicionamentos e as teorias sobre o episódio do massacre, espraiaram-se em
vertentes diversas: de ponderações de cunho sociológico a manifestações
emotivas, cunhadas pelo sofrimento de quem teve sua vida vinculada ao fato.
Chegou-se a pedir a remoção do busto do general Costa e Silva de uma praça
pública de Ipatinga e a mudança do nome da Avenida Magalhães Pinto, sob o
argumento de que seriam pessoas integrantes do esquema de poder que organizara
o golpe de 1964.
Leitura
esclarecedora encontrei no livro “O massacre de Ipatinga: Mitos e Verdades”, da
escritora Marilene Tuler, no qual a escritora prospecta, organiza
cronologicamente os fatos, identifica os atores e seus papeis e adota a metodologia
de pesquisa denominada “Análise do Discurso”, o que dá idoneidade à obra.
Nas
considerações finais de Marilene, percebi uma sintonia com a maioria das
opiniões e teses apresentadas na audiência pública. Pareceu-me haver um
consenso construído em torno de que: a violência imperou porque houve
“despreparo dos policiais em lidar com confrontos de rua”; os idealizadores da
USIMINAS, por ideologia da época, deram primazia ao capital (construção da
Usiminas) em detrimento das “condições de vida da classe trabalhadora”; o
governo de Minas, a Usiminas e a PMMG desconstruíram o fato histórico do
massacre, por meio da imposição de um “silenciamento” ao povo de Ipatinga sobre
o episódio de 07 de outubro de 1963.
O SINDIPA foi
apontado também responsável pela manutenção do véu da ignorância, uma vez que
essa organização sindical se marcou “pela submissão” e ausência de “confrontos
com a direção da empresa”.
Seria ingênuo acreditar
que as instituições militares sejam destituídas de ideologia política. Muito
menos que não as tenham as empresas, principalmente as estatais, cujos
dirigentes são escolhidos por quem representa o poder vigente. As instituições,
porém, não são coisas personificadas: suas almas são flutuantes porque se
desenham conforme o espírito de quem as dirige. Instituições são ficção, mas os
efeitos que produzem pela atuação de seus dirigentes são reais; às vezes
injustos e cruéis.
Irrelevante,
se havia ou não comunistas infiltrados nos movimentos dos operários da Usiminas
nos idos de 1963. Como afirma Marilene, isso é “um mito construído para
inocentar os militares”. Nada justifica apontar uma metralhadora “ponto 30”
–arma de guerra – para uma multidão de pessoas desarmadas.
Sobre os
militares envolvidos e os vigilantes da Usiminas, vem à mente as ponderações de
SARAMAGO, quando cria no “Evangelho Segundo Jesus Cristo” o ponto de vista do
soldado romano encarregado por Herodes de assassinar as crianças em Belém: “Muito
desgraçados somos nós, que não nos chega praticarmos a parte de mal que nos
coube por natureza, e ainda temos de ser braço da maldade de outros e do seu
poder”. O soldado, o vigilante e, às
vezes, o empregado nada mais são do que o instrumento da maldade daquele que
está no poder. Isso, todavia, não lhes retira a responsabilidade pelos atos que
praticaram.
Penso que, ao
invés de silenciarem sobre o ocorrido, melhor seria que a PMMG e a USIMINAS, a
exemplo do que fez o Papa João Paulo II, que formalmente pediu perdão “pelas
iniquidades cometidas pela Igreja Católica em sua história”, reconhecessem os
excessos e pedissem desculpas pela histórica falta.