INVESTIGAÇÃO
DE PATERNIDADE E AÇÕES CORRELATAS
Professor:
Jorge Ferreira da Silva Filho*
Notas Didáticas para
Orientação de Alunos de Cursos de Direito
Ações
de Estado. O Estatuto da Criança
e do Adolescente (Lei 8.069/90), no seu artigo 27, consagrou a
imprescritibilidade do direito ao reconhecimento do estado de filiação, assim
enunciando: O reconhecimento do estado de
filiação é direito personalíssimo, indisponível e imprescritível, podendo ser
exercitado contra os pais ou seus herdeiros, sem qualquer restrição, observado
o segredo de Justiça. Isso significa que uma pessoa, via de regra, terá o
direito de ver declarado quem é o seu genitor biológico, independentemente de
existir ou não a filiação registrada na certidão de nascimento. O nome genérico
de tais procedimentos judiciais é “ação de investigação de paternidade ou
maternidade”.[i] Há,
porém, uma grande confusão terminológica, devendo o aluno ficar atento às
discrepâncias entre doutrinadores e membros do Judiciário. O objeto da ação é o
que importa e não o nome da ação. http://jorgeferreirablog.blogspot.com.br/2013/03/mini-dic.html
Investigação Oficiosa da Paternidade. Não se trata propriamente de uma ação, mas de um
procedimento administrativo que tem por finalidade perguntar oficialmente, ao
homem apontado pela mãe solteira como sendo o pai de seu filho, se ele confirma
ou não a paternidade que lhe é imputada. O procedimento tem a vantagem de
evitar o desgaste emocional e as despesas com a “ação de reconhecimento”. [ii] Tem previsão legal na Lei 8.560/92, no artigo
2º: http://jorgeferreirablog.blogspot.com.br/2013/03/mini-dic.html
Ação de Investigação de Paternidade. A rigor, qualquer um que busca conhecer a verdade
biológica de sua origem está investigando a paternidade. Entretanto, a Lei
8560/92 criou a expressão “ação de investigação de paternidade” (art. 2º, §4º;
art. 2º -A) para designar o meio processual pelo qual alguém, que tem no
registro de nascimento apenas o nome da mãe, busca identificar e declarar quem é o seu
genitor biológico. O rito é ordinário. O indigitado pai poderá ser declarado
judicialmente como tal, no caso de
recusa em se submeter ao “exame de código genético - DNA” (art. 2º-A, parágrafo
único, da Lei 8560/92). Esse dispositivo está em sintonia com a Súmula 301 do
STJ. A sentença que reconhece a paternidade deve fixar os alimentos
“provisionais ou definitivos”, devidos pelo pai ao filho reconhecido, quando
este deles necessitar (art. 7º da Lei 8560/92). O Código Civil expressamente se
refere à ação de investigação de paternidade ou maternidade (CC 1.615) ao final
do Capítulo que trata do reconhecimento de filho.
Ação de Prova de Filiação. Prevista no art. 1.606 do CC, essa ação é também
denominada “Ação de investigação da filiação”. [iii]
É direito personalíssimo do filho. Apenas se o filho morrer, enquanto menor ou
incapaz, sem ter deflagrado a ação é que a legitimidade passa aos herdeiros.
Todavia, se iniciada a ação, os herdeiros podem continuá-la. Nada mais é que
uma ação de investigação de paternidade. Qualquer um que demonstrar o interesse
pode contestar a ação de investigação de paternidade e maternidade (CC 1.615). Embora
seja essa ação personalíssima, o STJ já admitiu a ação de netos contra os avós
tendo por objeto declarar a relação avoenga (REsp 604.154; 3ª T. Rel. Waldemar
Zveiter)[iv]
Ação Desconstitutiva de Registro. Ação movida pelo filho maior de idade contra o pai
registral. Atingida a maioridade ou efetivada a emancipação, o filho maior tem
o prazo de 4 (quatro anos) para rejeitar o pai registral — repudiar a paternidade — (CC 1.614).[v] O
direito pode ser exercido sem que o filho exponha em juízo os motivos que o
levaram a propor a ação. Não se trata de ação para descobrir quem é o genitor
biológico. O objeto da ação é a “desconstituição do vínculo de filiação
registral”. [vi] O filho
simplesmente se recusa (nega a paternidade a ele estabelecida) a aceitar a
paternidade registral. Deve, porém, na inicial, afirmar que não existe a
filiação sócio-afetiva.[vii] O
réu deverá provar que é o pai biológico, caso queira manter seu estado de pai
registral. Ultrapassados os quatro anos, o filho somente poderá pedir a
desconstituição da paternidade registral exibindo prova da “inexistência do
vínculo biológico”[viii]
Ação Anulatória de Reconhecimento. Confira “Ação
Anulatória de Registro”.
Ação Anulatória de Registro. Ação que tem como causa de pedir a afirmação de que é
falso ou inexato o registro de nascimento efetivado.[ix] A
possibilidade jurídica do pedido ampara-se no art. 1.604 do CC. O pressuposto
fático é de que o declarante da paternidade perante o oficial de registro civil
fez afirmações intencionalmente inexatas ou falsas. Tem legitimidade ativa o
filho contra o declarante. Igual legitimidade se estende à mãe registral.[x] A
ação é imprescritível. Essa ação também
se denomina “ação anulatória de reconhecimento”. [xi] O
STJ já reconheceu no REsp 799.588/SE (Relator Aldir Passarinho; julgado em
28.10.2008), a legitimidade de irmão do genitor para essa categoria de ação. A
maioria entende que havendo interesse material ou moral qualquer pessoa tem
legitimidade ativa para a ação anulatória, inclusive o Ministério Público. [xii]
Filiação sócio-afetiva versus Anulação do Registro. Ainda que fique
demonstrado que o registro de nascimento não retrata a verdade biológica, fato
que levaria os tribunais a anular o registro e desconstituir a filiação, provada
a existência do vínculo sócio-afetivo (filiação sociológica), a anulação não
será decretada. [xiii]
Ação
de Contestação da Paternidade legalmente presumida. Denomina-se também “Ação Negatória de Paternidade”.
Trata-se de ação movida pelo pai casado ou em união estável em face do filho. Prevista
no artigo 1.601 do CC, esta ação tem o
marido como legitimado ativo. Na causa de pedir o marido contesta (nega) a
paternidade de filho nascido de sua mulher. Essa ação é imprescritível. [xiv] Incabível quando o filho resulta de fecundação artificial heteróloga http://jorgeferreirablog.blogspot.com.br/2013/03/mini-dic.html
Ação negatória de Paternidade. Vide comentários na Ação de Contestação da Paternidade
legalmente presumida.
Ação Negatória de
Paternidade movida por pai biológico contra pai registral casado. Em tal ação o autor está dizendo que: teve um filho com
uma mulher casada (infidelidade feminina); o marido da mulher infiel desconhece
que o filho registrado em seu nome não é seu filho biológico. A doutrina majoritária
sustenta que o pai biológico não tem legitimidade ativa para essa ação.[xv] A
lei confere legitimidade para contestar (negar) a paternidade registral, apenas
ao marido. O pai biológico não está contemplado expressamente na lei com essa
legitimidade ativa. Maria Berenice Dias advoga no sentido de que “nada
justifica limitar a ação do genitor”. Tal possibilidade jurídica, se admitida
for, poderá trazer sérios abalos ao filho, sendo este menor. Devem-se sopesar
dois princípios: interesse de proteção ao menor; busca da verdade real.
Ação
Negatória de Maternidade. Com as inovações introduzidas pela medicina
referentes à reprodução assistida, uma mulher pode gestar um filho que não foi
gerado pela fecundação de seu óvulo. Cai por terra a presunção mater semper certa est. [xvi]
Tanto era improvável essa ação que não há no Código Civil um dispositivo
próprio sobre essa matéria. Embora a lei (CC 1.601) tenha enunciada a
imprescritibilidade do direito de negação da filiação registral apenas em
relação ao pai, reconhece-se à mãe igual direito.[xvii]
Resta-lhe apenas a legitimidade para a ação de falsidade do registro.
Imprescritibilidade
da ação de estado.
O STF produziu a Súmula 149 que enuncia: “É imprescritível a ação de
investigação de paternidade, mas não o é a de petição de herança”. A
interpretação sistemática dos artigos 27 do ECA e 1614 do CC é complexa. O
Código Civil é lei mais nova que o ECA, assim se poderia interpretar o art.
1614 do CC no sentido de que o filho, com registro de nascimento inexato, tendo
atingido a idade de 22 anos, não mais poderia mover a ação anulatória de
registro. Paradoxalmente, quem não tem a filiação declarada na certidão poderia
buscar essa verdade a qualquer tempo (imprescritível). Melhor caminhou a
interpretação no sentido de que “não se pode subtrair do filho o direito de
investigar seu genitor”. [xviii]
Ação
declaratória da verdadeira ascendência genética. A posição atual do
Direito brasileiro é no sentido de que todos têm o direito de conhecer sua
origem, ou seja, quem são os genitores biológicos. Isso, entretanto, não tem o
condão de alterar o registro de nascimento, ficando demonstrada a existência da
filiação socioafetiva. [xix] A
sentença na ação que busca a ascendência genética, nesse caso, tem natureza
meramente declaratória sobre o genitor biológico, mas não altera a relação de
filiação. Filiação é instituto de natureza jurídica, não sendo essencial o
aspecto biológico. Cf. fecundação artificial heteróloga em http://jorgeferreirablog.blogspot.com.br/2013/03/mini-dic.html
Ação Declaratória da Filiação Socioafetiva. No findar do Século XX, a sociedade brasileira
elevou o afeto à categoria de valor jurídico de suprema importância para o
Direito de Família[xx]. A experiência vivenciada por dois seres
humanos, na qual um ser em formação se ampara no ser já formado, tornando-se
este a referência, o suporte, o guia, o protetor, o orientador, a segurança, a
fonte de ternura e o disciplinador daquele, tem o condão de criar o suporte
fático denominado “posse de estado de filho”. Paradigmáticos são os julgados do
TJRS contidos nos acórdãos das apelações AC 70029363918 (8ª Câm., j.
07.05.2009) e 70008795775 (7ª Câm., 23.06.2004); transcrevendo-se: “En este sentido, ya ha expresado el Tribunal
de Justicia del Rio Grande do Sul – Brasil: Ação de investigação de
paternidade. Presença da relação de socioafetividade. Determinação do pai
biológico através do exame de dna. Manutenção do registro com a declaração da
paternidade biológica. Possibilidade. Teoria tridimensional. Mesmo havendo pai
registral, o filho tem o direito constitucional de buscar sua filiação
biológica (CF, § 6º do art. 227), pelo princípio da dignidade da pessoa humana.
O estado de filiação é a qualificação jurídica da relação de parentesco entre
pai e filho que estabelece um complexo de direitos e deveres reciprocamente
considerados. Constitui-se em decorrência da lei (arts. 1.593, 1.596 e 1.597 do
Código Civil, e 227 da Constituição Federal), ou em razão da posse do estado de
filho advinda da convivência familiar. Nem a paternidade socioafetiva e nem a
paternidade biológica podem se sobrepor uma à outra. Ambas as paternidades são
iguais, não havendo prevalência de nenhuma delas porque fazem parte da condição
humana tridimensional, que é genética, afetiva e ontológica. Apelo provido.
(TJRS; AC 70029363918; 8ª C.Cív.; Rel. Des. Claudir Fidelis Faccenda; DOERS
14/05/2009; p. 55)”.
[i]
COELHO. Fábio Ulhoa. Curso de direito
civil. Volume 5. São Paulo: Saraiva, 2006, p.174.
[ii]
COELHO. Fábio Ulhoa. Curso de direito
civil. Volume 5. São Paulo: Saraiva, 2006, p.176.
[iii]
MADALENO, Rolf. Curso de direito de familia. 2. ed. Rio de Janeiro, Forense,
2008, p. 439.
[iv]
Cf. MADALENO, Rolf. Curso de direito de familia. 2. ed. Rio de Janeiro,
Forense, 2008, p. 440.
[v] Art. 1.614. O filho maior não pode ser reconhecido
sem o seu consentimento, e o menor pode impugnar o reconhecimento, nos quatro
anos que se seguirem à maioridade, ou à emancipação.
[vi] DIAS, Maria Berenice. Manual de direito de famílias.
7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p.382
[vii]
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito de famílias. 7. ed. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2011, p. 383.
[viii]
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito de famílias. 7. ed. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2011, p. 382.
[ix] DIAS, Maria Berenice. Manual de direito de famílias.
7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 382.
[x]
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito de famílias. 7. ed. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2011, p. 389.
[xi] MADALENO,
Rolf. Curso de direito de familia. 2. ed. Rio de Janeiro, Forense, 2008, p. 431.
[xii] MADALENO,
Rolf. Curso de direito de familia. 2. ed. Rio de Janeiro, Forense, 2008, p. 431.
[xiii] MADALENO,
Rolf. Curso de direito de familia. 2. ed. Rio de Janeiro, Forense, 2008, p. 432.
[xiv] Art. 1.601. Cabe ao marido o direito de contestar a
paternidade dos filhos nascidos de sua mulher, sendo tal ação imprescritível.
[xv]
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito de famílias. 7. ed. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2011, p. 385. LÔBO,
Paulo. Direito Civil: famílias. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 239.
[xvi]
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito de famílias. 7. ed. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2011, p. 389.
[xvii]
COELHO. Fábio Ulhoa. Curso de direito
civil. Volume 5. São Paulo: Saraiva, 2006, p.180.
[xviii] DIAS,
Maria Berenice. Manual de direito de famílias. 7. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2011, p. 391.
[xix]
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito de famílias. 7. ed. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2011, p. 392.
[xx]
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito de famílias. 7. ed. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2011, p. 393.
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