CASAMENTO – VICISSITUDES - NOTAS DIDÁTICAS – Professor Jorge Ferreira da
Silva Filho – OAB-MG 76.018
INVALIDADES – DISSOLUÇÃO – EFICÁCIA
Atualização: 17 de agosto de 2016
Legislação Pertinente: Código Civil: Artigos 1548 a 1582
Leituras recomendadas: DIAS,
Maria Berenice. Manual de direito de famílias. 10. ed. São Paulo, 2015. VELOSO,
Zeno. Nome civil da pessoa natural. In: Tratado de direito das famílias. Coord.
Rodrigo da Cunha Pereira. IBDFAM, 2015.
1
– VICISSITUDES DO CASAMENTO. O casamento é como a vida: nasce,
desenvolve, passa por crises produz efeitos, gera direitos e obrigações e um
dia chega ao seu fim. Pode ser inválido ( nulo ou anulável). Extingue-se com a
morte de um dos consortes ou pelo divórcio. Pode modificar o nome das pessoas
(CC 16 c/c 1.565, §1º). Desenvolveremos o assunto abordando sequencialmente: o
nome; o estado civil o casamento nulo; o
casamento anulável; o divórcio; e a eficácia do casamento.
2
- DO NOME DA PESSOA CASADA. O nome é um direito inserido na
categoria “direitos da personalidade”. Conota-se direito público, ou o dever de
ter um nome (VELOSO, 424). Compõe-se de
prenome e sobrenome (estirpe familiar). Entre 18 e 19 anos a pessoa poderá “alterar
o nome, desde que não prejudique os apelidos de família” (LRP 56). Possível
também é, excepcional e motivadamente, a pessoa requerer a modificação de seu
nome (LRP 56 e 57), viabilizando-se esse pedido apenas por sentença.
Homenageia-se o princípio da imutabilidade relativa do nome, objetivando-se a
segurança jurídica. Erros no nome de registro podem ser corrigidos pela via
administrativa (LRP 110). Com o casamento qualquer noivo pode acrescentar o
sobrenome do outro ao seu ou até mesmo suprimir o nome de sua família adotando
o sobrenome do cônjuge (DIAS, 119). A mulher solteira que viva com homem casado
pode acrescentar o sobrenome (patronímico) do companheiro (LRP 57 §2º). Diz a
lei que, com o divórcio, o cônjuge tem o direito de manter o nome de casado
(1.571§2º). Não tem mais sentido o enunciado o art. 1.578 do CC (DIAS,
121).
3
- O ESTADO CIVIL. O estado civil de uma pessoa diz
respeito à qualidade de quem teve ou não um casamento. Integra a qualificação
de uma pessoa (NCPC 319, II) e configura “atributo da personalidade” (DIAS 163).
A pessoa nasce solteira. Se casar, qualifica-se como casada. Perdendo o cônjuge
passa ao estado de viúva (o). O Decreto-lei 1.608 de 1941 (CPC/39) tratava do
“Desquite por mútuo consentimento”, permitindo-o, depois de dois anos de
casamento (CPC/39 – 642 a 646). A qualidade de desquitada diminuía a mulher na
sociedade. O STF pronunciou sobre o tema pela Súmula 379. Pelo desquite reconhecia-se uma separação
jurídica (de fato). O desquitado não podia contrair novo casamento. A Lei do
Divórcio (6.515/77; art. 41) ainda fez referência a esse estado civil, mas
trouxe com ela estados civis novos: o divorciado; o separado judicialmente. Com
isso registram-se os seguintes estados civis: solteiro; casado; viúvo;
divorciado; desquitado (em desuso); separado judicialmente (caminha para a
extinção); separado de fato. A lei não tratou diretamente do estado civil de
quem vive em união estável, porém, as pessoas, nas suas qualificações devem
declarar a “existência da união estável” (CPC 2015 – 319, II). Os principais
reflexos do estado civil de uma pessoa são de ordem patrimonial.
4- INVALIDADES DO
CASAMENTO. Sob essa rubrica, nos artigos
1548 a 1564 do CC, o legislador trata das hipóteses de casamentos nulo e
anulável. A doutrina ainda discute sobre o casamento inexistente. Abordaremos o
tema invalidades do casamento tratando dos casamentos: inexistente; nulo;
anulável.
5 - CASAMENTO INEXISTENTE.
A teoria do ato jurídico inexistente não goza mais de qualquer prestígio no
direito de família. Não há casamento inexistente, mas casamento nulo ou
anulável (DIAS 182). Os vetustos elementos para acolher o casamento inexistente
são: diferença de sexo; celebração por autoridade incompetente; inexistência de
manifestação válida da vontade de casar. O primeiro virou cinzas com a decisão
do STF (ADI 4277 e ADPF 132 – 5/5/2011). O segundo é inconsistente com o art.
1550, VI. O terceiro sucumbe perante a dicção do art. 1558.
5 - CASAMENTO NULO. O
casamento é declarado nulo quanto contraído: “I - pelo enfermo mental sem o
necessário discernimento para os atos da vida civil; II - por infringência de
impedimento” (CC 1548). Tem legitimidade para propor a ação de nulidade
qualquer interessado ou o MP: “A decretação (sic) de nulidade de casamento, pelos motivos previstos no artigo
antecedente, pode ser promovida mediante ação direta, por qualquer interessado,
ou pelo Ministério Público” (CC 1.549).
6 - CASAMENTO ANULÁVEL. O
casamento é anulável nas seguintes hipóteses previstas na lei: “I - de quem não
completou a idade mínima para casar; II - do menor em idade núbil, quando não
autorizado por seu representante legal; III - por vício da vontade, nos termos
dos arts. 1.556 a 1.558; IV - do incapaz de consentir ou manifestar, de modo
inequívoco, o consentimento; V - realizado pelo mandatário, sem que ele ou o
outro contraente soubesse da revogação do mandato, e não sobrevindo coabitação
entre os cônjuges; VI - por incompetência da autoridade celebrante” (CC 1.550).
6 – A. O VÍCIO DA VONTADE
QUE PERMITE A ANULAÇÃO DO CASAMENTO. Como se sabe os vícios de vontade permitem
a anulação dos atos jurídicos com eles relacionados (CC 171). O legislador
criou a categoria de vício denominado ERRO ESSENCIAL (CC1556 e 1557), como o
fato idôneo a permitir a anulação do casamento, e ressaltou expressamente a
coação, como vício apto a anular o casamento (CC 1558). Sobre o erro essencial, dispõe a lei:
“Considera-se erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge: I - o que diz
respeito à sua identidade, sua honra e boa fama, sendo esse erro tal que o seu
conhecimento ulterior torne insuportável a vida em comum ao cônjuge enganado;
II - a ignorância de crime, anterior ao casamento, que, por sua natureza, torne
insuportável a vida conjugal; III - a ignorância, anterior ao casamento, de
defeito físico irremediável, ou de moléstia grave e transmissível, pelo
contágio ou herança, capaz de pôr em risco a saúde do outro cônjuge ou de sua
descendência; IV - a ignorância, anterior ao casamento, de doença mental grave
que, por sua natureza, torne insuportável a vida em comum ao cônjuge enganado”
(CC 1557).
7 - EFEITOS DA SENTENÇA
DE INVALIDADE DO CASAMENTO. Nulo ou anulável, a intervenção judicial é
necessária. Para o casamento que é nulo tem-se a ação declaratória de nulidade.
Para o casamento anulável maneja-se a ação desconstitutiva, ou seja, a que
decreta a anulação do casamento. Ambas possuem efeito ex tunc, dissolvendo-se o vínculo, “como se nunca tivesse existido”
(DIAS, 284). Ao cônjuge de boa-fé, a sentença somente tem efeito futuro,
dizendo a lei que sua eficácia depende do trânsito em julgado (CC 1.561). Se estiver em curso uma ação de invalidação
do casamento, a decretação incidente do divórcio em processo autônomo não obsta
o prosseguimento daquela.
8 - SOCIEDADE CONJUGAL E
VÍNCULO MATRIMONIAL. No art. 1571 do CC,
o legislador trata de duas relações jurídicas que integram o casamento: a
sociedade conjugal; o vínculo matrimonial (o casamento propriamente dito; o vínculo
de direitos e obrigações recíprocos entre os cônjuges). A sociedade conjugal é
um dos efeitos do casamento e diz respeito principalmente aos efeitos
patrimoniais (formação de patrimônio comum; administração dos bens; dever de
contribuição para as despesas etc.). A lei diz que a sociedade conjugal
termina: I - pela morte de um dos cônjuges; II - pela nulidade ou anulação do
casamento; III - pela separação judicial; IV - pelo divórcio. Em seguida, no
que toca ao vínculo matrimonial, o legislador elege a morte e o divórcio como
os únicos eventos jurídicos idôneos a extinguir o vínculo: “O casamento válido
só se dissolve pela morte de um dos cônjuges ou pelo divórcio, aplicando-se a
presunção estabelecida neste Código quanto ao ausente”. (CC 1571 §1º).
9 - SEPARAÇÃO JUDICIAL –
PROCEDIMENTO REVOGADO OU EM VIGÊNCIA? Até a promulgação da Emenda
Constitucional 66, de 13/07/2010, que alterou a redação do §6º, do artigo 226
da Constituição Federal, a separação judicial deixou de ser exigida como
requisito prévio ao divórcio. Na realidade, a Constituição não mais impôs
qualquer requisito, passando o direito ao divórcio ser meramente potestativo.
Com isso, o discurso majoritário da doutrina e da jurisprudência caminhou no
sentido de dizer que inexiste mais no sistema brasileiro a separação judicial.
Transcreve-se: “Embora permaneçam,
ainda, no Código Civil, alguns dispositivos que tratam da separação judicial
(artigos 1.571 e 1.578), a partir da edição da Emenda Constitucional nº
66/2010, não há mais a possibilidade de se buscar o fim da sociedade conjugal
por meio deste instituto, mas, tão somente, a dissolução do casamento pelo
divórcio” (TJMG, Apelação Cível n. 1.0487.06.021825-1/001(1), Des. Rel. Darcio
Mendes, 07/02/2011).
10 - EXTINÇÃO DA
SOCIEDADE CONJUGAL PELA NULIDADE OU ANULAÇÃO DO CASAMENTO. Tanto a declaração
da nulidade como a decretação da invalidade do casamento põe fim à sociedade
conjugal (CC 1571, II).
11 - MITIGAÇÕES DA LEI –
PRESERVAÇÃO DO CASAMENTO. O legislador facilita a realização de casamento
daquele que ainda não completou a idade núbil. Assim, no artigo 1.551, tem-se
que: “Não se anulará, por motivo de idade, o casamento de que resultou
gravidez”. No artigo 1.553: “O menor que não atingiu a idade núbil poderá,
depois de completá-la, confirmar seu casamento, com a autorização de seus
representantes legais, se necessária, ou com suprimento judicial”. Se o
casamento não for celebrado pelo oficial do Cartório, ainda assim poderá ser
válido (CC 1554). Até o casamento de menor entre 16 e 18 anos, quando não
autorizado por seu representante legal, poderá ser convalidado por decurso de
prazo (CC 1.555).
12 - ANULAÇÃO DO
CASAMENTO E A CULPA. Com o divórcio, depois da Emenda Constitucional 66,
findou-se a discussão sobre a culpa, ou seja, sobre a causa que gerou o fim do
casamento. Existindo ou não um culpado para o fim da relação, isso em nada
prejudica os direitos de cada um ao término do vínculo matrimonial. Entretanto,
quando o casamento extingue-se pela anulação, o discurso do legislador enuncia
uma sanção para o cônjuge que deu causa à extinção da sociedade conjugal, pois
assim afirma o artigo 1.564 do CC: “Quando o casamento for anulado por culpa de
um dos cônjuges, este incorrerá: I - na perda de todas as vantagens havidas do
cônjuge inocente; II - na obrigação de cumprir as promessas que lhe fez no
contrato antenupcial”.
13 - ASPECTOS PROCESSUAIS
DA AÇÃO DE DIVÓRCIO. O divórcio pode ser litigioso ou consensual. Na forma
consensual o legislador admite sua realização por duas vias: a judicial; a
administrativa, por via de escritura pública (NCPC 733 c/c 731). O divórcio por
escritura pública somente será possível se o casal não tiver filhos menores ou
incapazes. Na escritura pública de
divórcio (EPD) deverão constar: descrição e partilha dos bens comuns; pensão
alimentícia entre os cônjuges; guarda e regime de visita (convivência) dos
filhos incapazes; valor da contribuição para criar e educar os filhos. Embora o
NCPC nada diga, a retomada ou não do nome de solteira (o) é oportuna. A EPD não
depende de homologação judicial. É título hábil ao registro civil e de
imóveis. Exige-se a assistência de
advogado, comum ou de cada uma das partes, ou ainda do defensor público.
14 - DIVÓRCIO CONSENSUAL
REALIZADO PERANTE AUTORIDADE CONSULAR. A LEI n 18.874, de 29 de outubro de
2013, modificou os artigo 18 do Decreto 4657/42, dando-lhe a seguinte redação:
“Art. 18..... § 1º As autoridades consulares brasileiras também poderão
celebrar a separação consensual e o divórcio consensual de brasileiros, não
havendo filhos menores ou incapazes do casal e observados os requisitos legais
quanto aos prazos, devendo constar da respectiva escritura pública as
disposições relativas à descrição e à partilha dos bens comuns e à pensão
alimentícia e, ainda, ao acordo quanto à retomada pelo cônjuge de seu nome de
solteiro ou à manutenção do nome adotado quando se deu o casamento. § 2o É indispensável a assistência de
advogado, devidamente constituído, que se dará mediante a subscrição de
petição, juntamente com ambas as partes, ou com apenas uma delas, caso a outra
constitua advogado próprio, não se fazendo necessário que a assinatura do
advogado conste da escritura pública” (NR – nova redação).
15 – EFICÁCIA DO
CASAMENTO. Há múltiplos significados
para a palavra eficácia. No presente contexto ela significa a capacidade de
produzir efeitos, ou resultados. Portanto, o estudo da eficácia do casamento
circunscreve-se ao conhecimento dos resultados, ou efeitos, jurídicos
decorrentes da celebração do casamento. A Constituição Federal de 1988 provocou
uma grande transformação nos modos de pensar a família e a eficácia do
casamento (LOBO, 113).
16 - REGULAMENTAÇÃO BÁSICA. Sob a rubrica “Da
eficácia do casamento”, o Código Civil, por meio dos artigos 1.565 a 1570,
trata de vários efeitos do casamento, tais como: o de gerar para ambos os
cônjuges a condição de consorte; a imposição de deveres recíprocos; a
instituição do poder-dever de dirigir a sociedade conjugal; estabelecer a
supremacia do interesse do casal e dos filhos, como ponto orientador das
decisões direcionais da sociedade conjugal; o dever de contribuir para o
sustento da família; regras para escolha do domicílio; fixação das hipóteses
que permitem a um dos cônjuges, com exclusividade, exercer a direção da
família. Tudo, porém, balizado pela regra da igualdade fixada no art. 226, §5º,
da Constituição Federal.
17 - CONSORTES -
COMPANHEIROS. Determina a lei que pelo casamento, os cônjuges assumem a
condição de consortes, tornam-se companheiros e coresponsáveis pelos encargos
da família (CC 1.565). O casamento configura-se um efetivo contrato de adesão,
pois a maioria dos seus efeitos, principalmente os deveres e direitos, são
impostos pelo Estado.
18 - O ACRÉSCIMO DO
SOBRENOME. No Código de 1916 cabia à mulher a faculdade de acrescentar ou não
ao seu sobrenome [apelidos] o sobrenome do marido. Atualmente, qualquer dos
nubentes pode “acrescer ao seu o sobrenome do outro” (CC 1.565, §1º). Reflexo
direto do princípio da igualdade dos cônjuges.
19 - O PLANEJAMENTO
FAMILIAR. Sob a rubrica da “eficácia do casamento” o legislador dispõe sobre o
direito de liberdade do casal em relação ao planejamento familiar (CC 1565
§2º). Dispositivo inócuo, uma vez que a Constituição Federal (artigo 226 §7º)
já consagrará tal direito, inclusive fincando-o sobre os princípios da
dignidade da pessoa humana e o da paternidade responsável. Atualmente
prefere-se usar a expressão “planejamento reprodutivo” (RIBDFAM-nº 4, 69). Não
se confundem direitos sexuais com direitos reprodutivos. Ao Estado compete dar
meios lícitos ao casal para limitar ou aumentar o número de filhos (DIAS, 258).
A Lei 9.263/96 regulamenta o planejamento familiar. Discute-se a
constitucionalidade do §5º, art. 10, da lei retro, que diz: “na vigência da
sociedade conjugal, a esterilização depende do consentimento expresso de ambos
os cônjuges” (RIBDFAM-nº 4, 74)
20 - DEVERES DE CADA UM
DOS CÔNJUGES. Não há dúvida que os deveres comuns dos cônjuges configuram-se
uma moeda de duas faces. O dever de um deles faz nascer o direito para o outro
e vice-versa. O legislador, modificando a dicção anterior, que determinava
deveres diferentes para a mulher e o homem, estabeleceu como deveres de ambos:
a fidelidade recíproca; a vida em comum, no domicílio conjugal; a mútua
assistência; o sustento, a guarda e educação dos filhos; o respeito e
consideração mútuos (CC 1566, I a V).
21 - A INEFICÁCIA DO
DISCURSO SOBRE O DEVER DE FIDELIDADE E COABITAÇÃO. Dos deveres estabelecidos
para ambos os cônjuges, será demonstrado abaixo que não há qualquer sanção para
quem for infiel ou deixar de coabitar. Entretanto, os demais deveres
insculpidos nos incisos do artigo 1.566 do CC se mostram hígidos e sintonizados
com a ideia moderna e constitucional sobre o instituto família (LOBO, 124).
22 - A QUESTÃO DA
FIDELIDADE. A infidelidade, na literalidade da lei, constituía grave violação
dos deveres do casamento e autorizava o cônjuge traído a promover a ação de
separação judicial (CC 1573 c/c 1572). A maioria da doutrina considera que a
Emenda Constitucional 66/2010 pôs fim ao instituto processual denominado ação
de separação judicial, prevista no artigo 1.572 do CC. Atualmente, qualquer um
pode pedir o divórcio sem ter que explicar o motivo pelo qual o deseja.
Trata-se de direito potestativo podendo ser exercido por qualquer dos cônjuges
independentemente de condições e circunstâncias. Com isso, a infidelidade
passou a ser uma transgressão que não mais atrai mais qualquer sanção, seja na
esfera civil ou criminal, embora se constitua em fato apto a causar no traído o
dano moral, indenizável na forma do artigo 927 do CC. Alguns entendem que o
dever de fidelidade decorre do caráter monogâmico do casamento (GONÇALVES,
174); apenas uma mulher, apenas um homem. A infidelidade o adultério. Fato que
já foi tipo penal (Art. 240 CP, revogado pela Lei 11.106/2005). Essa antiga
figura penal inseria-se no capítulo “dos crimes contra o casamento”. No tocante
à bigamia, que significa a celebração de novo casamento por alguém que já é
casado, constitui ainda crime, com pena de reclusão de 02 a 06 anos (art. 235
CP). O crime de bigamia não permite a aplicação da Lei 9.099/95, art. 61.
Marcos Alves da Silva, um dos fundadores do Instituto Brasileiro de Família do
Paraná (IBDFAM-PR), defende que a monogamia não se sustenta como princípio
estruturante do estatuto jurídico da família. Acrescenta: Quando, em termos
jurídicos, se faz referência à infidelidade está pressuposto o dever jurídico
da fidelidade. Sustento que não existe um dever jurídico de fidelidade. Creio
que a Emenda 66 reforça minha tese. Só há que se falar em dever jurídico se do
seu descumprimento decorrer uma sanção, uma eficácia jurídica. Caso contrário
ele converte-se em um dever simplesmente moral. O Estado Moderno tornou-se
herdeiro de um grande equívoco. A Igreja chamou a si o poder de regular e controlar
a sexualidade tanto em sua dimensão reprodutiva como erótica. Com as Revoluções
Burguesas, o Estado trouxe a si, sem grande alteração de fundo, este poder
regulatório. Não faz qualquer sentido, atualmente, que o Estado mantenha a
pretensão de regular a sexualidade. Neste campo, a autonomia privada deve ter a
máxima expansão. O Estado somente deve intervir para tutelar as pessoas que nas
relações familiares encontrem-se em situação de vulnerabilidade. Mas não para
cercear a liberdade das pessoas.
23 - A INFIDELIDADE
VIRTUAL. Com a internet e as redes sociais, a doutrina passou a discorrer sobre
a possibilidade de se verificar a infidelidade virtual. Uma espécie de namoro
da pessoa casada por via da internet. Em primeiro lugar, o espaço cibernético
está protegido constitucionalmente. Acessar, sem autorização, ainda que não
bloqueado por senha, informações em correio eletrônico ou aquelas
disponibilizadas apenas aos “amigos” na rede social constitui-se infração ao
direito de inviolabilidade do sigilo da correspondência (CF 5º XII) e invasão
da privacidade. (DIAS, 257).
24 - INFIDELIDADE NÃO
GERA DEVER DE INDENIZAR. A violação dos deveres impostos pelo casamento, dentre
eles a fidelidade, por si só, não é capaz de provocar lesão à honra e ensejar a
reparação por dano moral. Com esse entendimento, o Tribunal de Justiça de São Paulo
(TJSP) negou provimento a recurso de ex-mulher que alega ter sofrido danos
morais devido a infidelidade do ex-marido.
A decisão é do dia 20 maio. No caso, a mulher pleiteava indenização
sustentando que, ao ser infiel, o ex violou os deveres do casamento previstos
no artigo 1.566, do Código Civil. Ela alegou que sofreu danos morais, pois o
adultério lhe causou sofrimento, abalo psicológico e humilhação. O juiz de
primeiro grau julgou improcedente a demanda, condenando a mulher ao pagamento
das custas, despesas processuais, além de honorários advocatícios fixados em R$
1.000,00, observada a gratuidade concedida. A mulher interpôs recurso de
apelação ao TJSP pedindo a reforma da sentença. Para o desembargador Cesar Luiz
de Almeida, relator, os dissabores sofridos pela mulher no divórcio não são
suficientes para a caracterização de déficit psíquico que enseje a reparação
por danos morais. “Para que haja a obrigação de indenizar, faz-se necessária a
descrição de atos que ultrapassem a simples infidelidade e exponham
sobremaneira o cônjuge traído, gerando um verdadeiro sentimento de angústia e
impotência que passa a orbitar, diariamente, o psiquismo da pessoa,
causando-lhe sofrimento, o que não se vislumbra no caso dos autos”. Segundo o
processo, a mulher apenas desconfiava que o homem estivesse lhe traindo quando
requereu o divórcio, confirmando essa dúvida somente depois. “Assim, observadas
as particularidades da situação, se conclui que não houve abalo psicológico
capaz de ocasionar dano moral indenizável, e a improcedência era mesmo de
rigor”. Para o advogado Sérgio Barradas Careiro, sócio honorário do IBDFAM, “o
êxito de uma relação a dois é mérito de ambos os parceiros. Da mesma forma, o
seu fracasso deve ser atribuído a ambos. O moderno Direito das Famílias não
atribui apenas a uma parte o fim da relação, não se apurando, portanto, as
causas desta dissolução”, disse. Ele explica que para se obter indenização,
faz-se necessária a comprovação de atos que ultrapassem a simples infidelidade
e exponham o cônjuge traído, gerando um verdadeiro sentimento de angústia e
impotência, causando sofrimento ou exposição pública. Barradas destaca que a Emenda Constitucional
66, de 2010, de sua autoria, que suprimiu o instituto da separação judicial e
eliminou o prazo de dois anos para o divórcio direto, aboliu a apuração da
culpa pelo fim da união. “Assim sendo, não mais interessa ao Estado os motivos
da dissolução da sociedade conjugal. Trata-se do essencial: decretação do
divórcio, manutenção de sobrenomes, divisão de patrimônio; se tem filhos
menores, guarda e pensão alimentícia. Neste sentido, a EC 66 reforça a não
apuração de casos de infidelidade”, garante. 03/06/2015. Fonte: Ass. Com. IBDFAM:
http://ibdfam.org.br/noticias/5657/Infidelidade+n%C3%A3o+gera+dever+de+indenizar+o+ex%2C+decide+TJSP
25 - O SENTIDO DA
EXPRESSÃO “VIDA EM COMUM”. O pensamento tradicional entendia que o dever de
vida em comum [coabitação] abrangia viver sob o mesmo teto e praticar relações
sexuais com seu consorte [débito conjugal]. Há posicionamentos dizendo que o
homem que forçasse sua mulher a com ele ter relações sexuais não cometia o
crime de estupro. Atualmente, há
interpretações mais brandas dizendo que o enunciado do artigo 1566, II não
implica a imposição do débito conjugal.
26 - O “DÉBITO CONJUGAL”.
Expressão anacrônica que provoca a ideia de existir o direito de um dos
cônjuges exigir que o outro tenha com ele relações sexuais. Do casamento não poderia nascer tal direito,
pois isso violaria, em relação ao parceiro que se recusa à relação sexual, o
direito à inviolabilidade do corpo, o princípio da dignidade da pessoa humana,
o direito à privacidade e, destacadamente, o direito à privacidade. A
abstinência sexual por si só não implica direito indenizatório, eis que a
conduta está amparada por princípios constitucionais. A Lei 11.340/2006 (Maria
da Penha) considera violência doméstica forçar uma relação sexual não desejada
(art. 7º, III). Noticiou-se que a Juíza de Direito Ângela Cristina Leão,
Goianira/GO, condenou a 9 anos, 4 meses e 15 dias de reclusão, em regime
fechado, um homem que estuprou a própria mulher. A magistrada afirmou que o
matrimônio não dá direito ao marido forçar a parceira à conjunção carnal contra
a vontade. O réu não poderá recorrer em liberdade. 01/08/2014 (http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI205250,81042-Marido+e+condenado+a+9+anos+de+prisao+por+estuprar+mulher).
27 - O DEVER DE MÚTUA
ASSISTÊNCIA. Na sociedade moderna o casamento é muito mais uma opção do que uma
necessidade. O elemento caracterizador da manutenção do vínculo conjugal é o
desejo de estabelecer uma vida em comum com outra pessoa. O efeito jurídico
principal é o de estabelecer a comunhão plena de vida (CC 1511), nascendo daí o
compromisso com a solidariedade. Este é o dever maior, do qual decorrem o dever
de mútua assistência material e moral. A ruptura jurídica do vínculo pode pôr
fim ao dever de assistência moral, mas, no plano do direito positivo, a
assistência material continua existindo para além do casamento, tal como o
dever de prestar alimentos ainda que sobrevindo o divórcio.
28 - O DEVER DE SUSTENTO
GUARDA E EDUCAÇÃO DOS FILHOS. Os pais têm o dever de “assistir, criar e educar
os filhos menores”, não importando se estes advenham ou não de um casamento (CF
229). O legislador, para o caso de filhos gerados na constância de um casamento
impõe redundantemente, como deveres do pai e da mãe, o sustento, a guarda e a
educação dos filhos (CC 1566, III). Os pais podem ser destituídos do poder
familiar se deixar o filho em abandono (CC 1638). A maioridade do filho não
implica automaticamente o cessar do dever de sustento (prestar alimentos). Se o
filho está frequentando curso superior (ou curso de formação profissional) a
obrigação se estende até a data que o filho completar 24 anos.
29 - OS DEVERES DOS PAIS
EM RELAÇÃO AO FILHO QUE FAZ PÓS-GRADUAÇÃO. O dever de sustento e educação dos
pais aos filhos maiores e capazes se estende, como afirmado acima, ao pagamento
das despesas com relação ao curso de graduação superior. No tocante ao dever
para com a continuidade da educação
superior (pós-graduação e mestrado) do filho,
o Superior Tribunal de Justiça se mostra resistente.
30 - ABANDONO AFETIVO E
RESPONSABILIDADE CIVIL. O STJ, em 2012, no REsp1.159.242, contrariando
posicionamentos anteriores, por maioria, decidiu que os pais têm o dever de
cuidar dos filhos. Cuidar não significa amar, mas, proteger, dar atenção,
orientar. Comportamentos objetivos e exigíveis dos pais. Cuidar é uma obrigação
de fazer. Inadimplemento gera responsabilidade civil. Cf. Voltaire de Freitas
Michel. “Você me paga se não me amar”.
In: Revista nº 04. Maio/Junho 2014 – IBDFAM. “o simples fato de ter gerado uma
vida compele os pais a cumprirem uma série de obrigações todas previstas em lei”
– Des. Luis Carlos Gambogi – AC 1.0145.07.4111698-2/001. O exercício da
liberdade sexual implica assumir riscos, inclusive o de gerar um filho para o
qual terá obrigações. “A necessidade de afeto é a necessidade de ser
compreendido, assistido, ajudado nas dificuldades, seguido com olhar benévolo e
confiante” (ABBAGNANO; RIBDFAM Nº4, p. 98).
31 - DEVER DE RESPEITO E
CONSIDERAÇÃO MÚTUOS. O Código Civil anterior não teve o privilégio de estampar
o dever de respeito e consideração mútuos como faz o Código de 2002. É no
respeito e na consideração de um cônjuge pelo outro que se pode viabilizar a
convivência no mar de pluralidades de opções que a vida proporciona num Estado
Democrático de Direito. São tantas as opções políticas, filosóficas, religiosas
e nas múltiplas vertentes da vida moderna, que o respeito e a consideração
pelas posições do outro se tornam importantes elementos para a manutenção do
casamento.
Valeu professor,muito bom.abcs
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