domingo, 9 de maio de 2010

T382 - Embargos na execução fiscal

T382 – Embargos do executado – Defesa do sujeito passivo na execução fiscal.

Notas Didáticas de Direito Tributário
Jorge Ferreira da Silva Filho
Professor de Direito Tributário e Processo Tributário do Centro Universitário do Leste Mineiro – UNILESTE
Mestre em Direito Público pela Universidade Gama Filho
Especialista em Direito Processual pela Escola Superior de Advocacia da OAB-MG.
Associado ao IAMG – Instituto dos Advogados de Minas Gerais

1. Propedêutica. A lei 6.830/80, denominada lei de execução fiscal (LEF), criada para dar celeridade e eficácia aos meios executórios para satisfação da dívida ativa da Fazenda Pública determinou, também, rito especial para a defesa do executado. Essa defesa é denominada simplesmente “EMBARGOS” (LEF, 16, caput) ou, ainda, “embargos do executado” (LEF, 16, §1º). A função dos embargos do executado é a de garantir a ampla defesa e o contraditório ao executado. Diferentemente da execução civil, os embargos somente serão admitidos se a execução fiscal for garantida (LEF, 16, §1º). O estudante deve ter especial atenção com as disposições sobre as formas de garantias, os prazos e a contagem dos prazos, pois estes diferem do estabelecido para a execução civil. O executado, depois de citado, terá cinco dias para pagar a dívida, com seus acréscimos ou, então, garantir a execução (LEF, 8º). A garantia da execução pode se dar por três vias: depósito em dinheiro, à ordem do juízo[I]; oferta de fiança bancária; nomeação de bens à penhora pelo executado. Se o executado não pagar nem garantir a execução, seus bens serão penhorados ou arrestados e penhorados. Efetivada a penhora, segue-se com a intimação do executado, por meio de publicação no órgão oficial, de que houve a juntada nos autos do termo ou do auto de penhora (LEF, 12). Depois de garantida a execução – pelo depósito[II], com a fiança bancária ou, ainda, com a penhora – o executado poderá apresentar sua defesa contra a pretensão executiva.

2. Embargos do executado[III] e Exceção de pré-executividade. Há casos em que o executado não tem recursos financeiros nem outros meios para garantir a dívida tributária que lhe é apontada. Isso impossibilitaria sua defesa, por meio dos embargos. Porém, se o executado tiver elementos e argumentos que possam atacar e desconstituir o processo de execução, isto é, extingui-lo sem discutir o valor do crédito indigitado, ele poderá promover o incidente denominado “exceção de pré-executividade” [IV]. Este instituto não tem amparo em nenhum dispositivo legal de ordem processual. Trata-se de uma realidade aceita pela doutrina e jurisprudência como instrumento de defesa, que se realiza por simples petição nos autos da execução fiscal[V].

3. Prazo para oferecimento dos embargos. O prazo para oferecimento dos embargos do executado é de 30 (trinta) dias contados da intimação da penhora ou, ainda, a partir do depósito ou da juntada da prova da fiança bancária (LEF, 16). A intimação da penhora se faz mediante publicação no órgão oficial do ato de juntada do termo ou do auto de penhora (LEF, 12, caput). Cuidado especial deve ser tomado com a intimação feita pelo Correio, pois, neste caso, a contagem do prazo de trinta dias se inicia a partir da intimação. Esta se considera feita na data da entrega da carta pelo correio (LEF, art. 12,§1º, c/c art. 8º, II) e não da juntada do AR (aviso de recebimento) aos autos.

4. Legitimidade ativa para os embargos do executado. Executado pode ser o devedor, o fiador, o espólio, a massa, o responsável pela dívida com a Fazenda, seja ela tributária ou não tributária, e ainda os sucessores do devedor (LEF, 4º). Responsável é aquele sujeito passivo que não se reveste da qualidade de contribuinte, como define o Código Tributário Nacional (artigos 134 e 135). Muitas pessoas podem ser qualificadas como responsáveis

5. As vias de garantia do juízo. A primeira via pela qual se garante a execução fiscal é o depósito em dinheiro no montante equivalente ao valor da dívida[VI]. O depósito deve ser feito na Caixa Econômica Federal ou nas outras instituições discriminadas no art. 32 da LEF. Portanto, realizado o depósito temos dois efeitos: suspensão da exigibilidade do crédito tributário (CTN, 151, II); abertura do prazo de 30 (trinta) dias para o oferecimento dos embargos do executado. Dois instrumentos legais devem ser observados para a validade do depósito; a lei 9.703/98 e o Decreto 2.850 de 30/11/1998. Na prática, efetivar o depósito judicial implica ter acesso ao DARF especial para essa finalidade[VII]. Diz a lei que o depósito, uma vez que configura garantia, deverá ser feito em até cinco dias depois da citação (LEF, 8º, caput). Porém, em termos práticos, não se realizando o depósito neste prazo, sua efetivação extemporânea configura-se válida, eis que o importante é a garantia da dívida. Além disso, não efetivado o depósito no prazo, a Fazenda deverá proceder com a penhora, e o dinheiro, conforme art. 11 da LEF, é o primeiro bem na ordem das coisas penhoráveis. A fiança bancária é o segundo instrumento de garantia da dívida tributária. Trata-se de um contrato entre o banco e o executado, pelo qual aquele assume a garantia da dívida tributária. A fiança bancária é um contrato oneroso e o banco além de cobrar por esta fiança normalmente exige amplas garantias. A terceira via de garantia é o oferecimento de bens à penhora, observando-se a ordem do art. 11 da LEF. O bem dado em garantia pode pertencer a terceiro (LEF, 9º, §1º).

6. Forma de autuação e efeitos dos embargos. Os embargos são autuados em apenso[VIII], implicando isso a distribuição da peça processual com o processo recebendo numeração própria[IX]. O juiz poderá receber ou não os embargos. Recebendo-o, o juiz deve dar o efeito suspensivo, significando isso, suspender o processo de execução fiscal. Não há na lei 6.830/80 um dispositivo específico que enuncie claramente que a execução fiscal deve ficar suspensa enquanto se processar os embargos do executado. A doutrina e a jurisprudência, porém, são uníssonas em dizer que recebidos os embargos o juiz deve suspender a execução[X].

7. O afastamento dos efeitos do art. 739-A do CPC. O Código de Processo Civil tem aplicação subsidiária quantos aos procedimentos de execução fiscal (LEF, 1º, parte final). Discutiu-se, então, se o comando do art. 739-A do CPC, introduzido pela lei 11.382/2006 seria aplicado à execução fiscal deixando, assim, ao critério juiz, dar ou não o efeito suspensivo à execução fiscal com o recebimento dos embargos do executado. A discussão convergiu para o entendimento de que, sendo norma especial, não se aplicam as regras da nova Lei 11.382/2006, principalmente o art. 739-A, §1º do CPC.

8. Do procedimento. A petição inicial deve atender os requisitos do art. 282 do CPC. Em relevo, deve ser reafirmada a garantia da execução, pois é requisito de admissibilidade dos embargos. Em seguida, o executado, agora denominado embargante, poderá alegar “toda matéria[XI] útil à defesa”, conforme garante inocuamente[XII] a lei (LEF, 16, §2º), pois tal garantia é constitucional. O objeto [pedido] dos embargos é no sentido de que o juiz julgue procedentes os embargos e decrete, por consequência, a insubsistência da execução fiscal. Em outras palavras, pleiteia-se que o juiz, na sentença, retire a eficácia executiva do título – a certidão de dívida ativa – e extinga a execução fiscal[XIII]. Formulado o pedido, o embargante fará expresso requerimento de provas, inclusive testemunhal. São admitidas até três testemunhas, podendo este número chegar a seis, a critério do juiz (LEF, 16, §2º). A inicial deve ser acompanhada de documentos necessários à prova das matérias alegadas na defesa do executado, sob pena de preclusão (CPC, 396). A reconvenção e a compensação de créditos não são admitidas como matéria nos embargos do executado (LEF, 16, §3º). Apesar dessa disposição, o STJ editou a Súmula 394[XIV], admitindo compensar valores relativos ao imposto de renda, na via dos embargos do executado. As exceções de incompetência, suspeição e impedimento, ao contrário do que ocorre no processo civil, são argüidos como preliminares e processadas nos próprios embargos (LEF, 16, §3º)[XV]. O valor da causa será igual ao da execução (LEF, 6º, §4º). Se recebidos os embargos a Fazenda será intimada para se manifestar. A peça processual de manifestação da Fazenda se denomina “impugnação”. O prazo que a Fazenda tem para impugnar os embargos é de trinta dias (LEF, 17). A intimação do procurador da Fazenda deve ser pessoal[XVI]. Impugnado ou não os embargos e dependendo da matéria arguida pelo embargante, o juiz designará ou não a audiência de instrução e julgamento. Se a matéria arguída nos embargos for apenas de direito ou se a prova das alegações for unicamente documental, não se realizará a audiência de instrução, devendo o juiz prolatar a sentença no prazo de 30 (trinta) dias (LEF, 17, p.u.).

9. Inexistência de revelia para a Fazenda Pública. Não existe pena de revelia para a Fazenda, podendo essa deixar de impugnar os embargos sem que isso lhe acarrete qualquer prejuízo[XVII], pois o crédito tributário é direito indisponível e irrenunciável[XVIII].

10. Antecipação de tutela – possibilidade. A natureza processual dos embargos do executado é eminentemente cognitiva. Sendo processo de conhecimento aplica-se, quando preenchidos os requisitos do art. 273 do CPC, o instituto da antecipação dos efeitos da tutela. Assim, preenchidos e deduzidos, na inicial, os requisitos para a obtenção da antecipação de tutela, o embargante poderá expressamente requerê-la, pois o juiz não a concederá de ofício[XIX].

[I] O comando do inciso I do art. 9º da LEF, quanto à parte que diz “à ordem do juízo”, não mais prevalece pois a lei 9.703/98 determinou que o dinheiro depositado, para fins de garantia da dívida fiscal, fosse repassado diretamente para a conta única do Tesouro Nacional (art. 1º, §2º).
[II] Merece destaque a declaração de inconstitucionalidade do art. 19 da lei 8.870/, na ADIN 1.074-3, que tem o seguinte enunciado: Art. 19. As ações judiciais, inclusive cautelares, que tenham por objeto a discussão de débito para com o INSS serão, obrigatoriamente, precedidas do depósito preparatório do valor do mesmo, monetariamente corrigido até a data de efetivação, acrescido dos juros, multa de mora e demais encargos. Daí resultou a súmula vinculante 28, com o seguinte enunciado: "É inconstitucional a exigência de depósito prévio como requisito de admissibilidade de ação judicial na qual se pretenda discutir a exigibilidade do crédito tributário". Interpretando-se, extensiva e teleologicamente a Súmula Vinculante 28, nenhuma garantia poderia ser exigida para se deduzir em juízo os embargos do executado.
[III] A expressão “embargos do executado” é preferível à “embargos do devedor”, haja vista que o executado poderá não ser o devedor, mas o fiador, o avalista ou outro responsável. Cf. CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. Vol. II. 14. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, p. 410.
[IV] CAIS, Cleide Previlatti. O processo tributário: de acordo com a medida provis´ria do parcelamento de débitos tributários – MP 449/2008 e Lei Complementar que altera o Supersimples – LC 128/2008. 6. ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2009, 592.
[V] “A exceção de pré-executividade aparece como medida substitutiva da segurança ou garantia em juízo, e seu cabimento ocorre basicamente em duas situações: (I) carência econômica do executado (art. 5º, XXXV e LV da CF) e (II) ausência no título executivo dos requisitos da liquidez, da certeza e da exigibilidade...” – SABBAG, Eduardo. Manual de direito tributário. 1. ed. 3ª tiragem. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 1056.
[VI] O depósito deve ser integral e em dinheiro, segundo teor da Súmula 112 do STJ.
[VII] Decreto 2.850/98. Art 1º “Os depósitos judiciais e extrajudiciais, em dinheiro, de valores referentes a tributos e contribuições federais, inclusive seus acessórios, administrados pela Secretaria da Receita Federal do Ministério da Fazenda, serão efetuados na Caixa Econômica Federal, mediante Documento de Arrecadação de Receitas Federais - DARF, específico para essa finalidade, conforme modelo a ser estabelecido por aquela Secretaria e confeccionado e distribuído pela Caixa Econômica Federal. § 1º O disposto neste artigo aplica-se, inclusive, aos débitos provenientes de tributos e contribuições inscritos em Dívida Ativa da União. § 2º Quando houver mais de um interessado na ação, o depósito à ordem e disposição do Juízo deverá ser efetuado, de forma individualizada, em nome de cada contribuinte. § 3º O DARF deverá conter, além de outros elementos fixados em ato do Secretário da Receita Federal, os dados necessários à identificação do órgão da Justiça onde estiver tramitando a ação, e ao controle da Caixa Econômica Federal”. (grifo do professor)
[VIII] “No juízo cível, medida pela qual, em situações especiais, autos de diferentes ações, mas conexas, são reunidas, passando a correr juntos, até decisão final” – Dicionário jurídico. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária.
[IX] CAIS, Cleide Previlatti. O processo tributário: de acordo com a medida provis´ria do parcelamento de débitos tributários – MP 449/2008 e Lei Complementar que altera o Supersimples – LC 128/2008. 6. ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2009, 594.
[X] CAIS, Cleide Previlatti. O processo tributário: de acordo com a medida provis´ria do parcelamento de débitos tributários – MP 449/2008 e Lei Complementar que altera o Supersimples – LC 128/2008. 6. ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2009, p. 594. SABBAG, Eduardo. Manual de direito tributário. 1. ed. 3ª tiragem. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 1.055.
[XI] A discussão e a declaração incidental de inconstitucionalidade de lei instituidora de tributo é matéria arguível em sede de embargos do executado. A decisão abrange apenas a esfera do caso concreto: Cf. NERY JÚNIOR, Nelson. NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de processo civil comentado e legislação processual civil extravagante em vigor: atualizado até 17.02.2010. 11. ed. – São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.
[XII] O art. 5º, inciso LV da Constituição Federal garante a ampla defesa nos processos administrativos e judiciais. Se o acusado ainda não teve oportunidade de se defender, como é o caso da execução fiscal em que o título executivo é produzido unilateralmente pela Administração Pública Tributária, qualquer restrição à defesa ofenderia a garantia constitucional retro mencionada. Cf. CAIS, Cleide Previlatti. O processo tributário: de acordo com a medida provisória do parcelamento de débitos tributários – MP 449/2008 e Lei Complementar que altera o Supersimples – LC 128/2008. 6. ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2009, p. 595.
[XIII] Câmara, op. Cit. P. 413.
[XIV] “É admissível, em embargos à execução fiscal, compensar valores de imposto de renda retidos indevidamente na fonte com os valores restituídos apurados na declaração anual.”
[XV] Cleide Privittali Cais entende que as exceções devem ser manifestadas em autos apartados, quando da apreciação possa resultar a declaração da incompetência absoluta do juízo – cf. Cais, op. Cit., p. 596.
[XVI] Cf. TRF 240.
[XVII] Súmula 256 do TRF “A falta de impugnação dos embargos do devedor não produz, em relação à Fazenda Pública, os efeitos da revelia”.
[XVIII] ALBUQUERQUE, Marcos Cavalcanti de. Lei de execução fiscal: interpretação e jurisprudência. São Paulo: Madras, 2003, p. 45
[XIX] CAIS, Cleide Previlatti. O processo tributário: de acordo com a medida provis´ria do parcelamento de débitos tributários – MP 449/2008 e Lei Complementar que altera o Supersimples – LC 128/2008. 6. ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2009, p. 595.

Nenhum comentário:

Postar um comentário