quinta-feira, 28 de junho de 2012

CAMISINHA ENCONTRADA EM LATA DE EXTRATO DE TOMATE

CAMISINHA DENTRO DE LATA DE EXTRATO DE TOMATE

v  Artigo publicado no jornal Diário do Aço - edição de 28/06/2012, página 2.

Por incrível que pareça, a notícia está entre as mais acessadas nos portais do mundo jurídico desta semana. Tudo isso porque a 3ª Turma do STJ (Superior Tribunal de Justiça) decidiu, no Recurso Especial 1317611, manter a condenação de um fabricante de extrato de tomate a pagar à compradora da lata que acondicionava esse produto a importância de R$10.000,00 (dez mil reais). A condenação se deu a  título de indenização por danos morais.
O dano moral circunscreveu-se ao fato de que uma senhora, depois de preparar e servir o jantar à sua família, usando parte do extrato de tomate adquirido, encontrou no fundo da lata um preservativo (camisinha) aberto.
A consumidora levou a camisinha e o extrato de tomate para análise e, concomitantemente, tentou uma composição com o fabricante. Pasmem os leitores:  o fabricante se recusou a compor com a consumidora, resultado disso uma ação. Houve condenação, no primeiro grau de jurisdição. O fabricante apelou. A sentença foi confirmada pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Ainda inconformada, alegando nulidade processual por indeferimento injusto da prova pericial, a empresa interpôs o Recurso Especial supra informado.  
A notícia certamente é pitoresca, mas além desse aspecto, há um universo de questões que surgem do conjunto dos fatos, tais como: Quanto custou aos cofres públicos (salários pagos ao juiz, aos desembargadores; aos ministros) decidir essa lide de R$10.000,00? Quanto o fabricante gastou com honorários de advogados para fazer chegar seu processo até Brasília (STJ)? O fato ocorrido é idôneo a causar o dano moral? Teria agido com inteligência o fabricante ao exercer sua belicosidade jurídica contra a consumidora?
Em primeiro lugar, temos uma Constituição que assegurou a nós brasileiros o acesso à justiça toda vez que nos sentirmos ultrajados ou desrespeitados em nossos direitos. Por isso, independentemente do valor, agiu a consumidora como verdadeira cidadã, ao não se curvar perante a resistência de uma poderosa multinacional. Por sua vez, o fabricante nada fez contra a lei, pois usou dos permissivos processuais legais para arrastar o processo, fazendo-o chegar ao STJ.
O que me parece inadequado é a existência de tantas vias processuais a informar o sistema recursal. Isso, sim, traz prejuízo aos cofres públicos e prejudica a pessoa pobre. O Estado e as grandes empresas têm fôlego financeiro para litigar por muitos anos. O pobre não pode esperar nem goza de tempo para litigar. O Estado paga seus procuradores com o nosso dinheiro. As grandes empresas têm despesas fixas com seus departamentos jurídicos ou escritórios contratados. Por isso rotineiramente recorrem contra tudo.  Na verdade, o atual sistema recursal favorece o Estado e as grandes empresas. Essa conjuntura perversa precisa ser modificada pelo nosso legislador.
Quanto ao dano moral, hoje tão desmoralizado,  no presente caso, parece-me perfeitamente cabível. Como se sabe o dano moral não se prova. Basta provar a existência do fato capaz de quebrar a harmonia (a paz) do espírito de qualquer pessoa que daí surgirá íntegro o dano moral. Não há dúvida. Que desespero deve ter passado esta família ao se deparar com o fato de que ingeriram um extrato de tomate no qual repousava uma camisinha. Ficariam doentes? Passariam mal? Certamente estão configurados momentos de angustia. Uma agonia que não pode ser tratada como mero aborrecimento. Justa é a reparação à consumidora.

Jorge Ferreira S. Filho. Advogado - Articulista. E-mail professorjorge1@hotmail.com  

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