segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Artigo: Os Vereadores e as OSCIPS




OS VEREADORES E AS OSCIPS

* (publicado no Jornal Diário do Aço – Edição de Domingo – 21/11/2010, página 07)

Arrumar emprego, ajudar aliados e promover eventos de lazer devem ser as principais funções de um deputado federal. Essa é a opinião de aproximadamente 60% dos eleitores entrevistados em pesquisa exclusiva conjunta (Época/Ibope) – Revista Época de 27/09/2010. Os mesmos eleitores responderam também que todas as eleições são importantes, todavia o grau de importância decresce conforme o cargo, na seguinte ordem: Presidente da República, Governador, Senador, Deputado Federal e Deputado Estadual. Além de mitigar a importância do legislativo, 79% dos eleitores responderam que o número de parlamentares deveria diminuir em todo o Brasil.
Muito se pode extrair da pesquisa referida, mas há um fato que sobressai: os vereadores não foram mencionados, ao que parece, nem pelo pesquisador nem pelo pesquisado. Tudo isso nos leva a concluir que a importância dada pelo eleitor aos vereadores é absolutamente divorciada da nobre e indispensável função que nossa Constituição atribuiu a esses representantes do povo na esfera municipal. O eleitor pesquisado causa a impressão de se esquecer que, antes de viver no Brasil e num Estado da federação, ele vive concretamente num município. O local onde o eleitor reside é o palco no qual se realiza, quantitativa e qualitativamente, a aplicação direta do dinheiro público. As enchentes, a qualidade da água recebida, a coleta do lixo, o esgoto “a céu aberto” em sua rua, a limpeza urbana, os riscos da dengue, a rapidez ou a lentidão com que flui o trânsito, as longas horas de paradas no trânsito; a distância do posto de saúde, a demora ou a baixa qualidade na prestação de serviço de saúde e muito mais são exemplos de questões vivenciadas e que devem ser corrigidas no âmbito municipal.
Um exemplo da importância dos vereadores pode ser extraído dos recentes acontecimentos vinculados à administração do prefeito de Ipatinga, Robson Gomes. Este, recentemente, tornou-se alvo de questionamentos relacionados com contratações de OSCIPS – Organização da Sociedade Ccivil de Interesse Público. As suspeitas de irregularidades divulgadas pela imprensa resultaram de um trabalho jornalístico de pesquisa tendo por base dados divulgados pela própria administração municipal: o “Portal da Transparência”. Parte da imprensa questionou, dentre outras vertentes, a forma, a conveniência, a finalidade e a efetiva execução do objeto de alguns contratos entre o Município e as OSCIP’s. Imediatamente falou-se em CPI, mas ninguém falou sobre a atuação preventiva dos vereadores, pois como se sabe, a Constituição Federal (art. 31) determina que “A fiscalização do Município será exercida pelo Poder Legislativo Municipal, mediante controle externo”. Daí, perguntar: se a imprensa detectou algum problema, tomando por base informações públicas, por que o legislativo municipal não o fez? Estaria sendo eficaz a atuação da vereança? O eleitor teria escolhido bem os seus vereadores?
Fato curioso é que nem sempre o eleitor cobra ou pune o administrador pelas estranhezas levantadas pela imprensa – Lula não foi afetado pelo mensalão; Paulo Maluf continua com intensa presença política; Dilma Roussef chegou à Presidência da República, apesar de Erenice Guerra; contratos para o “especializado” serviço de limpeza urbana são fechados entre o município e empresa privada, com prazo de vigência de 20 anos, sem maiores questionamentos pela maioria dos munícipes. Estranho, não?
No Brasil, o processo de licitação é, na forma da lei, quase perfeito; na prática, uma selva de insensatez. Dificilmente um produto será comprado em licitação pública, com preço igual ou abaixo daquele que é praticado no mercado. As explicações para os altos preços são igualmente esdrúxulas: quem vende para o poder público não sabe quando vai receber; há outros elementos “inconfessáveis” a considerar na composição de preço para a administração pública. Raramente se encontrará ilegalidade nas contratações por licitação pública, todavia, com perspicácia e determinação, perceber-se-á o desenho da imoralidade no contorno da sombra lançada pelo processo.
A lição que se tira disso tudo é que o vereador consubstancia peça chave no jogo democrático e elemento sustentador do pretendido Estado Democrático de Direito. Não há política pública capitaneada por Presidente da República ou Governador de Estado que possa produzir os resultados esperados sem a atuação eficaz do vereador. O primeiro elo entre o homem do povo e o Poder Político, exercido em nome do povo, se dá pelo vereador. Cabem a este “legislar sobre os assuntos de interesse local” e fiscalizar, preventiva e corretivamente, como estão sendo aplicados os recursos públicos.

Jorge Ferreira S. Filho – advogado – professor de Direito no Centro Universitário do Leste Mineiro - UNILESTE. e-mail professorjorge1@hotmail.com

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