quinta-feira, 18 de março de 2010

T320 - Lançamento Tributário

TP320 – Lançamento: conceito e espécies

Notas Didáticas de Direito Tributário
Jorge Ferreira da Silva Filho
Professor de Direito Tributário e Processo Tributário do Centro Universitário do Leste Mineiro – UNILESTE
Mestre em Direito Público pela Universidade Gama Filho
Especialista em Direito Processual pela Escola Superior de Advocacia da OAB-MG.
Associado ao IAMG – Instituto dos Advogados de Minas Gerais

1. Lançamento – Propedêutica. O lançamento é um ato administrativo[I] fiscal complexo, praticado privativamente[II] pela autoridade administrativa competente, e sua função é a de constituir o crédito tributário, como se conclui da rasa leitura do art. 142 do CTN.[III] O lançamento válido implica que a autoridade fiscal: verifique a exata delimitação do fato gerador ocorrido; determine quais são os tributos incidentes sobre o fato gerador; calcule o montante do tributo a ser pago; identifique o sujeito passivo (contribuinte ou responsável); e defina, caso encontre uma infração às normas tributárias, a penalidade cabível. Ocorrido o fato gerador nasce a obrigação tributária e o dever de o sujeito passivo, definido em lei, pagar o tributo correspondente. Isso implica previamente produzir a certeza e a liquidez da obrigação. A certeza decorre da exata valoração jurídica do fato imponível. [IV] A liquidez se perfaz quando o valor em moeda do tributo fica determinado.

2. Meios de realização do pagamento do tributo. Em termos práticos, o legislador viabilizou duas possibilidades para o sujeito passivo pagar o tributo. Na primeira, o sujeito passivo deve ser notificado pelo fisco sobre o valor do tributo a ser pago e o termo final para o pagamento. No segundo, o próprio sujeito passivo calcula o valor do tributo e antecipa o pagamento, ou seja, paga sem que haja qualquer intervenção ou contato com a autoridade fiscal. São exemplos da primeira possibilidade os lançamentos denominados “ex officio” e por declaração, descritos, respectivamente, nos artigos 149 e 147 do CTN. A segunda via de realização do pagamento é a descrita no art. 150 do CTN – lançamento por homologação.

3. Lançamento por declaração – ou misto. O “procedimento”, descrito no art. 147 do CTN[V], implica duas etapas: uma declaração – confissão – do sujeito passivo ao Fisco, dizendo que ocorreu tal fato gerador; em seguida, o fisco determina quais são os tributos imponíveis em relação ao fato gerador – acertamento jurídico – e calcula o valor do tributo, tornando-o capaz de exigibilidade. São exemplos de tributos lançados por declaração: ITBI; Imposto de Importação; Imposto de Exportação [VI].

4. Lançamento de ofício – ex officio. Previsto no artigo 149 do CTN, este lançamento se realiza apenas com a intervenção da autoridade administrativa fiscal, sem participação do sujeito passivo. A autoridade fiscal deve agir se e apenas se existir lei específica autorizando essa modalidade de lançamento (caput e inciso I, do art. 149 do CTN). Importante observar que o art. 149 contém nove incisos, todavia, os incisos II a IX tratam da revisão do lançamento. Atualmente, essa modalidade de lançamento se restringe a pequena gama de tributos, tais como: IPVA, IPTU, as Taxas, Contribuições e Melhoria, Contribuições Corporativas e COSIP.[VII] Não se deve confundir lançamento de ofício com auto de infração. [VIII]

5. Lançamento por homologação. Esse procedimento, delineado no art. 150 do CTN, joga a responsabilidade pelo acertamento jurídico e pelo cálculo do valor do tributo ao próprio sujeito passivo, sem intervenção de qualquer autoridade fiscal. O pagamento do tributo deve ser feito sob responsabilidade do sujeito passivo. Posteriormente, a autoridade fiscal poderá examinar se o tributo foi calculado e recolhido conforme a legislação e cobrar as diferenças encontradas. São exemplos de tributos lançados por homologação: ICMS; IPI; IR; PIS e COFINS; Empréstimos Compulsórios[IX]. O enunciado do art. 150 do CTN contradiz o conceito legal de lançamento contido no art. 142. A doutrina faz severas críticas à sistemática desse tipo de lançamento. [X]

6. Natureza jurídica do lançamento. Não há uniformidade na doutrina[XI]. Alguns entendem que a natureza do lançamento é declaratória[XII]; outros dizem que o lançamento tem natureza meramente constitutiva[XIII]. Cassone percebe a natureza jurídica do lançamento como declaratória e constitutiva[XIV]. Alberto Xavier, percebendo as limitações das posições retro, construiu a teoria dos graus sucessivos de eficácia e desenvolveu o conceito de atendibilidade. [XV] A exigibilidade do crédito tributário dependeria da constituição deste, pelo lançamento, e do vencimento do prazo assinado para o pagamento. A atendibilidade resume-se no preenchimento de todas as circunstâncias capazes de permitir ao sujeito passivo pagar seu tributo e ao sujeito ativo receber tal pagamento. A referida teoria pode ser assim sintetizada: ocorrido o fato gerador nasce a obrigação tributária, todavia, apenas em tese, pois ela depende de acertamentos (valor; sujeito passivo; prazo de pagamento etc); com o lançamento, acerta-se a obrigação, nascendo o crédito – obrigação atendível; vencido o prazo de pagamento o credor pode exigir a obrigação, fazendo-o pela simples cobrança administrativa (notificação para pagar o principal mais a multa e correção); não efetivado o pagamento inscreve-se o devedor na DIVIDA ATIVA, extraindo-se a CDA – certidão de dívida ativa – título de crédito extrajudicial que torna a obrigação exequível.

[I] O artigo 142 do CTN, expressamente, define o lançamento como “procedimento”. Parte da doutrina entende que o “lançamento” é um ato administrativo. Por todos citamos: COSTA, Regina Helena. Curso de direito tributário, Constituição e Código Tributário Nacional. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 217.
[II] A doutrina critica essa redação. Explica Carlos da Rocha Guimarães, dizendo: “O que se pode concluir de todo esse exame do problema é que o Código Tributário Nacional partiu do princípio apriorístico, e portanto somente ideal, segundo o qual todo tributo deveria ser sacramentado por um ato de lançamento, quando tal premissa não corresponde a realidade” – apud Aurélio Pitanga Seixas Filho. Estudos de procedimento administrativo fiscal. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2000, p. 35.
[III] Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível. Parágrafo único. A atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigatória, sob pena de responsabilidade funcional.
[IV] Aurélio Pitanga Seixas Filho. Estudos de procedimento administrativo fiscal. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2000, p. 23.
[V] Art. 147. O lançamento é efetuado com base na declaração do sujeito passivo ou de terceiro, quando um ou outro, na forma da legislação tributária, presta à autoridade administrativa informações sobre matéria de fato, indispensáveis à sua efetivação.
Notas: O exemplo clássico era o imposto de renda – “lançamentos relativos ao imposto de renda de pessoa física e jurídica, em que elas têm de prestar informações ao fisco” (Martins, 195 ). 2ª) Luciano Amaro e Ricardo Lobo Torres observam que no imposto de renda de pessoas físicas e jurídicas o contribuinte declarava os rendimentos obtidos e realizava as deduções e abatimentos. Em seguida o fisco procedia com a “notificação do lançamento” .
[VI] SABBAG, Eduardo. Manual de direito tributário. 1. ed. 3ª tiragem. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 711.
[VII] SABBAG, Eduardo. Manual de direito tributário. 1. ed. 3ª tiragem. São Paulo: Saraiva, 2009, pp. 710 e 711.
[VIII] COSTA, Regina Helena. Curso de direito tributário, Constituição e Código Tributário Nacional. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 226.
[IX] SABBAG, Eduardo. Manual de direito tributário. 1. ed. 3ª tiragem. São Paulo: Saraiva, 2009, pp. 715 e 716.
[X] São “disposições arrevesadas de nosso direito positivo” ( LucianoAmaro); que é uma “construção artificiosa” ( Ricardo Lobo Torres); que se trata de uma ficção jurídica. Carlos da Rocha Guimarães pontua “ O que se pode concluir de todo esse exame do problema é que o CTN partiu do princípio apriorístico, e portanto somente ideal, segundo o qual todo tributo deveria ser sacramentado por um ato de lançamento, quando tal premissa não corresponde à realidade jurídica”. ... “Em conseqüência, no que se refere ao lançamento por homologação expressa ou tácita (decurso de prazo), partindo o legislador de base sem suporte dogmático, mostra-se ele supérfluo e mesmo prejudicial a uma sistemática jurídica, por tornar mais complexa a normação da figura do lançamento” – (Aurélio Pitanga Seixas Filho. Estudos de procedimento administrativo fiscal. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2000, p. 35 ).
[XI] “As diversas prescrições jurídicas são produzidas geralmente sem qualquer preocupação com o conhecimento do sistema no qual se encartam. E até sem compromisso com a univocidade e a precisão técnica dos termos que emprega em seu discurso, ficando sob a responsabilidade dos juristas ‘o trabalho de desvelar a significação destes’. ... O estudo das questões concernentes ao lançamento tributário bem demonstra tais dificuldades”. – Hugo de Brito Machado. Aspectos do lançamento tributário. In: Curso de Direito Tributário e Finanças Públicas. Eurico Marcos Diniz de Santi (coordenador). São Paulo: Saraiva, 2008, p. 830.
[XII] MARTINS, Sérgio Pinto. Manual de direito tributário. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 172.
[XIII] AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 336.
[XIV] CASSONE, Vittorio. Direito tributário. 20. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 180.
[XV] AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 337.

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