domingo, 20 de maio de 2012

ADOÇAO - UMA LEI JUSTA?

A ADOÇÃO, A LEI E A DECISÃO JUSTA.

*Artigo publicado no Jornal Diário do Aço - Ipatinga/MG, em 21/05/2012, pag. 2

Sem dúvida, o instituto da adoção é um dos mais polêmicos e discutidos temas jurídicos da atualidade. Não é sem razão, pois a Constituição Federal provocou uma verdadeira revolução no modo de pensar a adoção, quando estabeleceu a igualdade plena de direitos e qualificações para os “filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção”.
Verdade é que a adoção não diz respeito apenas à criança e ao adolescente, pois o maior de 18 (dezoito) anos pode também ser adotado, por expressa previsão legal, mas, neste artigo discorro sobre a criança.
No tocante à criança, a Constituição a elegeu  como titular do direito “à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar”, exigível “da família, da sociedade e do Estado”. Vê-se, pois, que a adoção erige-se como um dos instrumentos que viabiliza (assegura) os direitos que nós brasileiros declaramos na nossa Constituição. Mas isso funciona? Como é a nossa realidade?
Em 2009, o presidente Lula sancionou a Lei 12.010 na qual determinou que a adoção de criança e do adolescente não mais seria regida pelo Código Civil, mas pelas regras do Estatuto da Criança e do Adolescente. Com isso, a adoção somente se viabilizaria no direito brasileiro por meio de uma sentença judicial. Ao exigir a prévia existência de processo judicial para efetivar uma adoção, extinguiu-se a adoção por escritura pública. Com isso, quem quiser adotar, deverá se submeter à  FILA; entrar democraticamente na fila para conseguir adotar alguém. Mas pergunto: o Poder Judiciário está estruturado para assegurar um processo de adoção compatível com a dignidade da pessoa humana? 
Partindo-se do levantamento realizado pelo IPEA em 2004, pode-se concluir que o Brasil ostentava uma cruel realidade: “87% das crianças que viviam em 589 abrigos tinham família”. Estavam ali por várias razões, mas isso não importa. O relevante é que se suas famílias não lhes poderiam assegurar os direitos insculpidos na Constituição, o Estado e a sociedade deveriam fazê-lo. Daí a importância das pessoas que querem adotar, pois cumprem espontaneamente o papel incumbido à sociedade.
Acontece, porém, que a criança não é coisa. É um ser humano em formação dotado do “espírito da dignidade”. Estudos realizados por especialistas, como aponta o famoso pesquisador Paulo Lôbo, demonstram que “quanto mais cedo é feita a adoção, menor o risco de a criança ter passado por experiências de abandono e sofrimento”. Concluíram também que  “a adoção a partir de 3 anos já é tardia”. Ora, mas a realidade brasileira, segundo Paulo Lobo, é que no Brasil havia “crianças à espera de adoção vivendo em abrigos por até 10 anos”. Seria isso digno?
No ECA está determinado que “A autoridade judiciária manterá, em cada comarca ou foro regional, um registro de crianças e adolescentes em condições de serem adotados e outro de pessoas interessadas na adoção”.   A inscrição dos candidatos deverá ser deferida “após prévia consulta aos órgãos técnicos do juizado, ouvido o Ministério Público”. Exige-se ainda “um período de preparação psicossocial e jurídica, orientado pela equipe técnica da Justiça da Infância e da Juventude”. Pergunto: há dinheiro para isso tudo?
Como se sabe, a Lei de Responsabilidade Fiscal não permite que o orçamento do Poder Judiciário seja feito conforme suas demandas. Há o famigerado percentual de 6%. Com isso, como todos sabem, a prestação jurisdicional não é plena. Nem o é a prestação administrativa.
Como ficam então os “pais” que furam a fila, assumido uma guarda de fato de uma criança,  derramando-lhe o afeto e os direitos que a lei enuncia, mas não consegue garantir? Respondo: Aplicando o princípio constitucional da dignidade da criança sobrepondo-o a impossibilidade de o Estado cumprir os direitos que assegurou e declarando a filiação.

Jorge Ferreira S. Filho. Advogado - Articulista. Presidente da Seccional Vale do Aço do Instituto dos Advogados de Minas - IAMG.  E-mail professorjorge1@hotmail.com

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