domingo, 14 de outubro de 2012

FAMILIA 30 - REGIME DE BENS

FAMÍLIA 30: REGIME DE BENS - NOTAS DIDÁTICAS
Professor: Jorge Ferreira da Silva Filho*  
Notas Didáticas Sintéticas para Orientação de Alunos de Cursos de Direito
 Disponibilizado no Blog EnsinoDemocrático -  http://jorgeferreirablog.blogspot.com
 Autorizada reprodução total ou parcial, desde que seja citado o site
 
1.      O REGIME DE BENS NA PERSPECTIVA JURÍDICA. É fácil perceber que nas duas principais formas de constituição de família (o casamento e a união estável) previstas no ordenamento jurídico brasileiro, eclode  entre os cônjuges e os companheiros, homo ou heteroafetivos, múltiplas relações de natureza tipicamente econômica.  São exemplos dessas relações: como repartir a responsabilidade pelo pagamento das despesas com o supermercado, o aluguel ou a prestação do financiamento da casa própria; saber se  determinado bem, imóvel ou móvel, pode ser alienado sem depender da anuência do outro cônjuge; determinar se um cônjuge pode ou não ter direito aos frutos de bens particulares do outro; Como administrar a propriedade comum e a particular de cada um dos cônjuges; quais atos jurídicos dependem da anuência do outro. Tudo isso perfaz o complexo das relações econômicas entre os cônjuges e companheiros, fato que interessou ao Direito regulamentar. O conjunto de regras jurídicas de direito positivo (http://jorgeferreirablog.blogspot.com.br/2012/04/familia-01-minidicionario.html ) que informam tais relações se denomina “Regime de Bens”. [i]
2.      CATEGORIAS DE REGIME DE BENS. O Código Civil trata de quatro categorias de regimes: separação de bens (CC 1687/1688); comunhão parcial de bens (CC 1658/1666); comunhão universal de bens (CC 1667/1671); participação final nos aquestos (CC 1672/1686). 
3.      OS EFEITOS PRINCIPAIS DECORRENTES DOS REGIMES DE BENS. O principal efeito do regime de bens relaciona-se com o critério da imposição ou não da cotitularidade sobre os direitos dos cônjuges e da coresponsabilidade sobre obrigações dos cônjuges.  O segundo efeito vincula-se ao fato de como será exercida a administração destes bens, inclusive o poder de aliená-los ou gravá-los. Finalmente, perquiri-se a respeito de como será partilhado cada bem na hipótese de extinção da sociedade conjugal (morte; divórcio; anulação de casamento; decretação de extinção da união estável).
4.      O SENTIDO DA PALAVRA “COMUNICAR”. O verbo “comunicar” comparece em vários artigos do Código Civil.[ii] Diz-se que há comunicação quando um bem ou uma obrigação, na esfera jurídica de um dos cônjuges, passa a integrar a esfera do outro.  Portanto, o significado jurídico da expressão “comunicação de bens”, no âmbito do direito patrimonial das famílias, tem por núcleo a ideia da comunhão (CC 1.659), ou seja, responsabilidade e direitos iguais. A comunicação de bens  opõe-se à ideia de “separação” da administração e do direito de propriedade” dos bens circunscritos a um dos cônjuges ou a ambos. [iii]
5.      O REGIME DE SEPARAÇÃO DE BENS - ESPÉCIES. Faz-se necessário ter cuidado com a terminologia, pois o legislador ora se refere ao regime da “separação obrigatória de bens” (CC 1829, I), enuncia como  “obrigatório o regime de separação de bens” (CC 1.641), faz menção expressa ao “regime da separação absoluta” (CC 1.647), e finalmente enuncia a estipulação da “separação de bens” (CC 1687). Interpretando-se sistematicamente os enunciados dos dispositivos retro, pode-se concluir que o regime da separação de bens é único. Todavia, ele comporta duas origens: a imposição pela lei (v.g. art. 1.641); a autoimposição, ou seja, livre estipulação pelos nubentes ou companheiros. Ambos obrigam as partes. Esclarecedor  é voto da Ministra Nancy Andrigui: “A separação de bens, que pode ser convencional ou legal, em ambas as hipóteses é obrigatória, porquanto os nubentes se obrigam por meio de pacto antenupcial - contrato solene - lavrado por escritura pública, enquanto na segunda, a obrigação é imposta por meio de previsão legal”. [iv] ­
6.      O REGIME DE SEPARAÇÃO DE BENS - CARACTERÍSTICAS. A ideia central do regime de separação de bens é a não comunicação (incomunicabilidade) dos direitos e obrigações existentes antes e depois de formada a sociedade conjugal. Nesse sentido enuncia o legislador: Estipulada a separação de bens, estes permanecerão sob a administração exclusiva de cada um dos cônjuges, que os poderá livremente alienar ou gravar de ônus real (CC 1687). Portanto, neste regime, legal ou convencional, cada um dos cônjuges ou companheiro poderá vender ou doar ou oferecer seus bens em garantia, sem depender da autorização do outro. No tocante às despesas comuns à vida conjugal (alimentação, energia elétrica, aluguel, água etc), ambos os cônjuges são obrigados a contribuir para as despesas do casal na proporção dos rendimentos de seu trabalho e de seus bens, salvo estipulação em contrário no pacto antenupcial. (CC 1688).
7.      O REGIME DA SEPARAÇÃO DE BENS OBRIGATÓRIO.  Trata-se do regime de separação de bens que não resulta da vontade dos nubentes. O regime é imposto pela lei quando um dos noivos se subsume a uma das seguintes hipóteses descritivas:  contrair núpcias desrespeitando pelo menos uma das causas suspensivas da celebração do casamento; na data do casamento sua idade for igual ou superior a 70 anos; qualquer dos nubentes tenha se casado por meio de suprimento judicial (CC. 1.641).
8.      A TORMENTOSA SÚMULA 377 DO STF. Antes do CC/2002, o STF se posicionou por meio do verbete 377, dizendo que “No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento”. [v]O fundamento axiológico da Súmula retro tem fincas no princípio da vedação ao enriquecimento sem causa. Com o advento do Código Civil de 2002, abriu-se uma discussão doutrinária se a Súmula em comento continuaria em vigor.[vi] Verdade é que o legislador, no CC/2002,  não reproduziu nem adequou o artigo 259 do Código Civil de 1916 que assim determinava: “Embora o regime [separação de bens] não seja o da comunhão de bens, prevalecerão, no silêncio do contrato, os princípios dela, quanto à comunicação dos adquiridos na constância do casamento”. Pressupondo que não o reproduziu intencionalmente, resta-nos concluir que a presunção de comunicação dos aquestos no regime da separação de bens não existe mais. Nem cabe também ainda vigorar a Súmula 377.[vii] Penso, entretanto, que a discussão é inócua, haja vista que existindo o esforço comum para a aquisição de um bem, ao interessado caberá provar que colaborou, independentemente de existir Súmula, pois vigora em nosso ordenamento o princípio da vedação ao enriquecimento sem causa.
9.      REGIME DA COMUNHÃO PARCIAL - ESTRUTURA TEMÁTICA. Por meio dos artigos 1658 a 1666, o legislador dispõe sobre: a regra geral caracterizadora da comunicação de bens (CC 1.658); Detalhamentos sobre a regra geral de comunicação (CC 1660); Hipóteses de exclusão da regra geral (CC 1.659 e 1.661); a forma de administração dos bens (CC 1663 e 1665); as regras sobre a responsabilidade pelas dívidas (CC 1664 1666). O ponto de partida é a regra geral: “comunicam-se os bens que sobrevierem ao casal, na constância do casamento”. Em seguida, o aluno deve se preocupar com a longa lista de exceções à regra geral.
10.  BENS QUE SE COMUNICAM NO REGIME DA COMUNHÃO PARCIAL. Conforme a redação do Art. 1.658, no regime de comunhão parcial, a regra geral é no sentido de que se comunicam os bens que sobrevierem ao casal, na constância do casamento, exceto, porém as exclusões previstas na lei. O legislador ressalta ainda alguns casos de bens que passam a integrar o patrimônio do marido ou da mulher, ou de ambos, dizendo que: Entram na comunhão: I - os bens adquiridos na constância do casamento por título oneroso, ainda que só em nome de um dos cônjuges; II - os bens adquiridos por fato eventual, com ou sem o concurso de trabalho ou despesa anterior; III - os bens adquiridos por doação, herança ou legado, em favor de ambos os cônjuges; IV - as benfeitorias em bens particulares de cada cônjuge; V - os frutos dos bens comuns, ou dos particulares de cada cônjuge, percebidos na constância do casamento, ou pendentes ao tempo de cessar a comunhão (CC 1660).
11.  A RESPONSABILIDADE PELAS DÍVIDAS. No regime da comunhão parcial, os bens da comunhão respondem pelas obrigações contraídas pelo marido ou pela mulher para atender aos encargos da família, às despesas de administração e às decorrentes de imposição legal (CC 1.664). Isso significa que tais bens podem ser penhorados num processo de execução por dívida nos casos retro. Entretanto, as dívidas, contraídas por qualquer dos cônjuges na administração de seus bens particulares e em benefício destes, não obrigam os bens comuns. Nesse caso, apenas os bens particulares podem ser penhorados para garantir dívidas contraídas por um dos cônjuges na administração de seus bens particulares (CC 1.666).
12.  BENS QUE NÃO SE COMUNICAM NO REGIME DA COMUNHÃO PARCIAL. A regra geral é que os bens, cuja aquisição da propriedade tenha ocorrida depois do casamento, comunicam-se. O legislador, porém, até abusando da lógica, expressamente excluiu da comunhão bens e obrigações a seguir relacionadas:  os bens que cada cônjuge possuir ao casar; os bens recebidos por doação durante o casamento; os bens egressos de sucessão causa mortis; os bens sub-rogados no lugar dos bens doados e herdados;  os bens adquiridos com valores exclusivamente pertencentes a um dos cônjuges em sub-rogação dos bens particulares; as obrigações anteriores ao casamento;  as obrigações provenientes de atos ilícitos, salvo reversão em proveito do casal; os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profissão de cada cônjuge; os proventos (http://jorgeferreirablog.blogspot.com.br/2012/04/familia-01-minidicionario.html ) do trabalho pessoal de cada cônjuge;  as pensões, meios-soldos, montepios e outras rendas semelhantes; os bens cuja aquisição tiver por título uma causa anterior ao casamento (CC 1659 e 1661). [viii]
13.  ASPECTOS POLÊMICOS DOS BENS EXCLUÍDOS DA COMUNHÃO. Suponha que o marido guarde em espécie todo o dinheiro que sobra de seu salário, ou seja, depois de ter cumprido suas obrigações no tocante às despesas familiares. Interpretando-se literalmente os incisos VI e VII do artigo 1659 do CC, essa importância não se comunicaria, implicando isso que a esposa não teria o direito à meação. Surge, pois, tal interpretação em desarmonia com espírito dos enunciados dos artigos 1.551, 1.566, III e 1.565 do CC. [ix] O STJ já decidiu no sentido de que: “1. Os valores oriundos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço configuram frutos civis do trabalho, integrando, nos casamentos realizados sob o regime da comunhão parcial sob a égide do Código Civil de 1916, patrimônio comum e, consequentemente, devendo serem considerados na partilha quando do divórcio. Inteligência do art. 271 do CC/16. 2. Interpretação restritiva dos enunciados dos arts. 269, IV, e 263, XIII, do Código Civil de 1916, entendendo-se que a incomunicabilidade abrange apenas o direito aos frutos civis do trabalho, não se estendendo aos valores recebidos por um dos cônjuges, sob pena de se malferir a própria natureza do regime da comunhão parcial” (Cf.  REsp-848660: 2006/0098251-2; DJe de 13/05/2011; Ministro Paulo de Tarso Severino). Ora, esta interpretação é razoavelmente assimilável, haja vista que o CC/16 determinava expressamente que “os frutos civis do trabalho de cada cônjuge” não se comunicavam no regime da comunhão universal (CC/16; art. 263, XIII) e, no caso do regime da comunhão parcial, a comunicação ocorria (CC/16; art. 271, VI). O CC/2002 não reproduziu tais artigos, porém criou o artigo 1.659, que no inciso VI determina a incomunicabilidade dos proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge, estendendo essa restrição ao regime da comunhão universal (CC 1668, V). A doutrina observa que a tendência do  STJ é caminhar no sentido de que as verbas indenizatórias de caráter pessoal não se comunicam. Exemplificando, no REsp 1024169 / RS, a Relatora Ministra NANCY ANDRIGHI, decidiu que “ No que concerne aos créditos decorrentes de ação de reparação civil movida pelo ex-cônjuge em face de terceiro, considerando que não há, no acórdão impugnado, qualquer elucidação a respeito do que teria gerado a pretensão reparatória fazendo apenas alusão a "eventuais valores provenientes de ações de dano moral e patrimonial" (fl.. 389), deve ser mantida a incomunicabilidade de possíveis valores advindos do julgamento da referida ação, porque, conforme declarado no acórdão recorrido, os prováveis danos sofridos unicamente pelo ex-cônjuge revestem-se de caráter personalíssimo” (publicado no DJe de 28/04/2010).
14.  O REGIME DA COMUNHÃO UNIVERSAL. Regime regulamentado nos artigos 1667 a 1671 do CC. Antes da lei do divórcio (Lei 6515/77) esse regime era considerado o regime legal. Isso significada que se os cônjuges não fizessem a opção pelo regime da comunhão parcial ou de separação de bens, prevaleceria o regime da comunhão universal. Sua essência está contida no caput do artigo 1.667 e se traduz pela comunicação dos  bens presentes e futuros dos cônjuges, com as exceções contidas na lei,  e suas dívidas passivas (http://jorgeferreirablog.blogspot.com.br/2012/04/familia-01-minidicionario.html) . São excluídos da comunhão:- os bens doados ou herdados com a cláusula de incomunicabilidade e os sub-rogados em seu lugar; os bens gravados de fideicomisso e o direito do herdeiro fideicomissário, antes de realizada a condição suspensiva; as dívidas anteriores ao casamento, salvo se provierem de despesas com seus aprestos, ou reverterem em proveito comum; as doações antenupciais feitas por um dos cônjuges ao outro com a cláusula de incomunicabilidade; Os bens referidos nos incisos V a VII do art. 1.659. Entretanto, a  incomunicabilidade dos bens enumerados no artigo 1668 do CC não se estende aos frutos, quando se percebam ou vençam durante o casamento.
15.  O REGIME DA PARTICIPAÇÃO FINAL NOS AQUESTOS. Com previsão legal nos artigos 1.772 a 1.686 do Código Civil, este regime tem natureza convencional. Surge no Brasil com o Código Civil 2002, mas já estava contemplado no projeto de lei desde 1975. Alguns dizem que este regime  tem duas formas que produzem efeitos em fases diferentes da vida dos cônjuges, pois durante o casamento o regime assemelha-se ao da separação convencional de bens e no final do casamento, os bens são divididos como se o regime fosse o da comunhão parcial. Trata-se do regime de bens mais abrangente em número de artigos  e complexidade dos enunciados.  Surgiu no cenário jurídico mundial na Costa Rica, em 1888, sob a denominação de regime da “participação diferida de bens gananciais”.[x]  A ideia básica deste sistema aportou nos ordenamentos jurídicos da Argentina, da Alemanha, da Espanha, da França, de Portugal e da Suécia. Merece destaque, pelo aspecto didático, a legislação civil espanhola que assim define este regime: Artículo 1344. Mediante la sociedad de gananciales se hacen comunes para los cónyuges las ganancias o beneficios obtenidos indistintamente por cualquiera de ellos, que les serán atribuidos por mitad al disolverse aquella.
16.  EMANAÇÕES DA DENOMINAÇÃO DO REGIME. Da denominação do regime em estudo (participação final nos aquestos) surgem de plano as seguintes perguntas: no final de quê haverá a participação nos aquestos? Qual o significado da palavra “participação” no  contexto normativo? A ideia jurídica de aquestos permanece com seu sentido clássico: “bens que foram adquiridos na constância da sociedade conjugal”? [xi]  Analisando conjuntamente os enunciados dos artigos 1.672, caput e 1.673, caput e parágrafo único, todos  do CC, pode-se concluir que há duas situações patrimoniais distintas: aquela que vigora durante o casamento (CC 1.673; p.u.) —   caracterizada pela liberdade que  cada cônjuge tem em relação ao seu “patrimônio próprio”—; a da incidência do direito de participação, “à época da dissolução da sociedade conjugal”,  sobre a metade dos bens adquiridos onerosamente pelo outro cônjuge  — “pelo casal”  —,  durante a vigência do casamento (CC 1.672). Nota-se, portanto, que o conhecimento prévio sobre o instituto denominado “patrimônio próprio” é propedêutico e didático.  
17.  O PATRIMÔNIO PRÓPRIO. Em síntese, pode-se dizer que as duas principais características do regime da participação final nos aquestos são: a liberdade de cada cônjuge, durante o casamento, para gerir o seu “patrimônio próprio”; a imposição legal de dividir, na dissolução “da sociedade”, os bens adquiridos onerosamente por qualquer dos cônjuges. No que se refere ao conceito de patrimônio próprio, afirma-se que o legislador o delimitou pelos elementos que o integram, ou seja, “os bens que cada cônjuge possuía ao casar e os por ele adquiridos, a qualquer título, na constância do casamento” (CC 1.673). Portanto, fazem parte do patrimônio próprio de cada cônjuge os bens: cuja aquisição da propriedade se verificara antes do casamento; adquiridos onerosamente, em conjunto ou individualmente; adquiridos gratuitamente (por doação ou herança). Importante ressaltar que neste regime um cônjuge pode adquirir um imóvel apenas em seu nome, conforme expressamente prevê a lei (CC 1.681). Em esquema tem-se: PP = BP + BANCC (Patrimônio Próprio = os bens adquiridos antes do casamento + os bens adquiridos na constância do casamento, a qualquer título).
18.  APURAÇÃO DO MONTANTE DOS AQUESTOS A SER DIVIDIDO OU COMPENSADO. Para fins de se apurar o que cada cônjuge tem direito ao final da “dissolução da sociedade conjugal”  há de se observar as réguas contidas nos incisos I a III do artigo 1.674 do CC. O objetivo destas é a apuração do “montante dos aquestos”, pois é essa cifra patrimonial que servirá de referência contábil para a participação de cada cônjuge. Não se trata, pois, de condomínio sobre as coisas adquiridas, mas participação econômica sobre o patrimônio adquirido pelo outro.[xii] O montante dos aquestos se apura por meio de uma operação aritmética relativamente simples. Em primeiro lugar deve-se chegar ao valor patrimonial do patrimônio próprio. Em seguida devem ser subtraídos desse montante os seguintes valores: dos bens anteriores ao casamento; dos bens que se sub-rogaram aos bens adquiridos anteriormente ao casamento; dos bens que sobrevieram ao cônjuge por sucessão; dos bens recebidos pelo cônjuge por meio de liberalidade (doação); das dívidas relativas aos bens retro especificados (CC 1.674); dos bens alienados em detrimento da meação (CC 1.676); dos bens doados por um dos cônjuges sem a autorização do outro (CC 1.675). Os aquestos, portanto, para este regime, é o conjunto dos bens de cada um dos cônjuges, ou seja, aqueles bens que, em nome próprio, o cônjuge adquiriu durante o casamento, mais os bens adquiridos em conjunto por ambos os cônjuges. [xiii] O objetivo é igualar os ganhos patrimoniais (os aquestos) dos cônjuges, ao término da convivência do casal.
19.  O SENTIDO PRÓPRIO DA EXPRESSÃO “DISSOLUÇÃO DA SOCIEDADE CONJUGAL”.  Há de se ter cuidado com a expressão, haja vista que o Código Civil estabelece que a sociedade conjugal dissolve-se pela morte de um dos cônjuges, pela anulação ou nulidade do casamento, pelo divórcio (CC 1571). Interpretando-se literalmente o dispositivo, enquanto não estiver transitada em julgado a sentença relativa aos processos de divórcio, à decretação da anulação do casamento ou declaratória de nulidade, os bens adquiridos pelos cônjuges já separados de fato entrariam no conceito de aquestos. Doutrina e jurisprudência repelem tal interpretação. No caso do regime da participação final nos aquestos, o legislador determinou expressamente que o momento em que cessou a convivência entre os cônjuges (data) é também considerado o  marco da dissolução da sociedade conjugal (CC 1.683).  
20.  ADMINISTRAÇÃO E ALIENAÇÃO DOS BENS DO PATRIMÔNIO PRÓPRIO. A lei possibilita que  cada cônjuge administre, sem depender do outro, os bens de seu  patrimônio próprio. Entretanto, o cônjuge não pode alienar o bem imóvel que integra esse patrimônio sem a outorga uxória ou marital. Importante observar que se os cônjuges estabelecerem no pacto antenupcial que cada um poderá alienar os imóveis escriturados em nome individual (bens particulares) sem a outorga do outro, tal convenção valerá, por expressa permissão legal (CC 1.656).[xiv] No tocante aos bens móveis, cada cônjuge pode aliená-los ou gravá-los independentemente do consentimento do outro (CC 1.673; p.u.).
21.  EXEMPLOS DE PARTICIPAÇÃO.  Suponhamos que o marido, antes do casamento, tivesse a propriedade de  um apartamento cujo valor atual é de R$1.000.000,00. A mulher, por sua vez, ao se casar tinha uma Ferrari - testa rossa, cujo valor atual é de R$500.000,00. Na constância do casamento o marido vendeu seu apartamento, empregando o dinheiro para adquirir, em nome próprio, uma cobertura cujo valor atual é de R$1.700.000,00. A mulher adquiriu, na constância do casamento, R$300.000,00 em ações da Petrobrás. Não há dívidas. Cessando a convivência como ficará a participação? Aplicando-se a regra geral, devem-se calcular os aquestos de cada um. Aquestos do marido= Patrimônio Próprio - Exclusões = R$1.700.00,00 - R$1.000,00= R$700.000,00. Aquestos da mulher = Patrimônio Próprio - Exclusões = R$800.000,00 - R$500.000,00= R$300.000,00. O montante dos aquestos do casal é de R$700.000,00 + R$300.000,00=R$1.000.000,00. Este montante deverá ser dividido igualmente, ou seja, cada um deverá ficar com R$1.000.000,00/2=R$500.000,00. Neste exemplo, adaptado da ilustração de Paulo Lôbo,[xv] o marido deverá restituir para a mulher R$200.000,00(duzentos mil reais)
22.  EFEITOS DA MORTE DE UM DOS CÔNJUGES CASADOS SOB O REGIME DA PARTICIPAÇÃO FINAL NOS AQUESTOS. Conforme expressamente determina a lei, falecendo um dos cônjuges dá-se a dissolução da sociedade conjugal. Os herdeiros do cônjuge falecido terão direito ao patrimônio que este teria na hipótese de ter dissolvido em vida a sociedade conjugal (CC 1.685). Em síntese, devem-se aplicar as regras dos artigos 1674 e demais regras correlatas ao cálculo dos aquestos. [xvi] As dívidas do cônjuge falecido não obrigam a participação do cônjuge supérstite nem se transmite, além da força da herança, aos herdeiros.
 
 
Referências.


[i] “Os regimes de bens constituem, pois, os princípios jurídicos que disciplinam as relações econômicas entre os cônjuges” (PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil: direito de família. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 187).
[ii] Exemplos: Artigos 1658; 1661; 1667;
[iii] “Quanto ao seu objeto, do regime de bens pode resultar a comunicação, total ou parcial dos haveres dos cônjuges, ou a sua separação” (Cf. PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil: direito de família. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 187). 
[iv] Recurso Especial 1.117.563 - SP (2009/0009726-0), Relatora Ministra Nancy Andrighi; julgado em 17/12/2009.
[v] PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil: direito de família. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 190.
[vi] Paulo Lobo e Rolf Madaleno, por todos que acolhem a permanência da Súmula 377 (LÔBO,  Paulo. Direito Civil: famílias. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 330; MADALENO, Rolf. Curso de direito de familia. 2. ed. Rio de Janeiro, Forense, 2008, p. 603).  Marina Berenice Dias entende que “Em face da exclusão da norma, o Código atual simplesmente desprezou a orientação da justiça e derrogou a súmula. Para determinar a repartição dos aquestos, passou a exigir a prova da efetiva colaboração na aquisição do matrimônio” (DIAS, Maria Berenice. Manual de direito de famílias. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 245).
[vii] “Como visto antes, a Súmula 377 já amenizara os efeitos desta norma. Com a redação do presente artigo [1641], restaurou-se o antigo preceito com toda severidade, porque ele enuncia exatamente o oposto, estabelecendo que no regime de separação legal, por ele estabelecido, não haverá comunhão de aquestos” (PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil: direito de família. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 195).
[ix] DIAS, Maria Berenice. Manual de direito de famílias. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 231.
[x] MADALENO, Rolf. Curso de direito de familia. 2. ed. Rio de Janeiro, Forense, 2008, p. 583.
[xi] SIDOU, J. M. Othon. Dicionário jurídico: Academia Brasileira de Letras Jurídicas. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1995.
[xii] DIAS, Maria Berenice. Manual de direito de famílias. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p.238.
[xiii] Idem, p. 237.
[xiv] MADALENO, Rolf. Curso de direito de familia. 2. ed. Rio de Janeiro, Forense, 2008, p. 582.
[xv] LÔBO,  Paulo. Direito Civil: famílias. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 337.
[xvi] Comentários ao Código Civil: artigo por artigo. Coordenadores Carlos Eduardo Nicoletti Camill ..[et al]. -São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 1.210.

3 comentários:

  1. [TRABALHO - TURMA 603 - TAMARA B CAETANO]
    Sobre os regimes de bens é correto dizer:

    a) - O regime de comunhão parcial de bens é imposto em alguns casos aos noivos, neste caso, é conhecido como regime de comunhão parcial de bens legal.
    b) - O regime de participação final dos aquestros é quando os bens do casal se comunicam somente apos o casamento.
    c) - O regime de comunhão universal de bens é o mais adotado, porque não necessita de pacto.
    d) - O pacto antenupcial só não é obrigatório no regime de comunhão parcial de bens.

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  2. TRABALHO-TURMA 603-ALEXANDRA NOGUEIRA AULA 30
    Sobre o regime de bens da União Estável, podemos considerar que e por forca da lei:

    a) Comunhão Parcial
    b) Comunhão Universal
    c) De separação de bens
    d) Participação final dos aquestos

    Resposta certa: a) Comunhão Parcial

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